A menos de três semanas do primeiro turno da eleição municipal, é dever chamar à responsabilidade as candidaturas para que meçam palavras e atitudes e não estimulem a violência política. Discursos raivosos, divisivos e ataques que ultrapassam a crítica aceitável entre adversários nas urnas não são apenas palavras ao vento. Têm consequências que, muitas vezes, podem ser graves e se voltar inclusive contra quem faz da virulência um ativo eleitoral.
A política, dimensão da vida em sociedade em que as eleições são o ponto alto, deve ser o espaço do debate civilizado de ideias
O assunto do dia ontem no país foi a agressão do candidato tucano à prefeitura de São Paulo, José Luiz Datena, ao concorrente Pablo Marçal (PRTB), um influenciador e ex-coach de passado nebuloso que faz da provocação a sua principal estratégia. Durante debate na TV Cultura, no domingo à noite, Datena desferiu uma cadeirada em Marçal. Foi uma das passagens mais deprimentes e grotescas já transmitidas ao vivo na história das eleições no país. O desfecho, porém, sequer pode ser considerado inesperado. Os dois já tinham protagonizado desentendimento em debate anterior, com ameaça de vias de fato.
Outro episódio de violência no domingo ocorreu no Rio Grande do Sul. Em Bagé, um comício do petista Luiz Fernando Mainardi foi interrompido quando um homem invadiu o evento e fez disparos em meio ao público. Fugiu em seguida. Por sorte, ninguém foi ferido. Nos Estados Unidos, no mesmo dia, o candidato republicano e ex-presidente Donald Trump foi aparentemente vítima de uma segunda tentativa de atentado a tiros, após escapar de ser assassinado em julho, quando um disparo acertou a sua orelha enquanto discursava.
Países como Brasil e EUA vivem um período de polarização e rivalidades ideológicas extremadas. Lideranças políticas deveriam ter a consciência de que quando se manifestam reiteradamente de forma belicosa estimulam comportamento violento também por parte de seus apoiadores e de eleitores de adversários. A retórica hostil, não raro, descamba para agressões físicas e mortes. As duas maiores democracias do continente vêm de eleições permeadas de casos de selvageria e tragédias.
A política, dimensão da vida em sociedade em que as eleições são o ponto alto, deve ser o espaço do debate civilizado de ideias e da apresentação de propostas para solucionar problemas, melhorar as condições de vida das comunidades e desenvolvê-las. Infelizmente, nota-se que, no lugar de concepções e projetos, conteúdos ofensivos vêm recebendo maior atenção, potencializados em especial pelas redes sociais, à espera de urgente regulamentação no país. Argumentos importam cada vez menos, e o que mais engaja é o ultraje. O adversário, que deveria ser apenas um oponente no campo das convicções, torna-se um inimigo a ser eliminado. Este é um caminho perigoso para as democracias.
A aproximação do pleito de outubro, em uma atmosfera política inflamável, traz o risco de as rivalidades, muito além das críticas legítimas próprias do período eleitoral, extrapolarem os limites da disputa política. Aguarda-se dos líderes e candidatos que ajam com ponderação para não acirrar ânimos. A ampla maioria da população rejeita bizarrices e ofensas e está à espera de proposições.