O melhor cenário para o país seria se a turbulência dos últimos dias servisse como uma lição proveitosa para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Os acontecimentos recentes são didáticos em relação a posturas que devem ser evitadas e atitudes que produzem reflexos positivos.
Foi positiva a fala de Lula, dizendo-se compromissado com a saúde das contas do país, mas resta saber se a postura será mantida
Ao atacar repetidamente a credibilidade do Banco Central (BC) e não se comprometer de forma clara com a higidez das contas públicas, Lula contribuiu para uma alta forte do dólar, para a elevação dos juros futuros e para o aumento das expectativas de inflação. Ao abandonar o tom belicoso, afirmar ter compromisso com a responsabilidade fiscal e dar sinal verde para a equipe econômica passar um pente-fino em gastos, ajudou a distensionar o ambiente das finanças, invertendo o movimento do mercado. Deve-se lembrar que esses não são indicadores abstratos. Têm reflexos na economia real e, portanto, no bem-estar dos cidadãos.
Informações de bastidores reveladas pela imprensa indicam que Lula foi aconselhado por economistas e pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a baixar as armas. As consequências práticas das palavras do presidente, afinal, deixaram o governo ainda mais acuado. Na quarta-feira, Haddad anunciou cortes da ordem de R$ 25,9 bilhões em despesas previstas para 2025 e ressaltou que Lula reafirmou o compromisso de cumprir o novo arcabouço fiscal.
Respeitar as metas do conjunto de regras destinado a dar sustentabilidade às finanças do país, em vigência há menos de um ano, é o mínimo esperado. A apresentação desse instrumento, em substituição ao teto de gastos, fez parte do acordo para a aprovação da PEC da Transição, no final de 2022. Mesmo assim, o governo já flexibilizou o novo arcabouço, alterando os objetivos de 2025 a 2028. Para o próximo ano, por exemplo, propôs em abril ter déficit zero, em vez de perseguir superávit de 0,5% do PIB. As sinalizações das últimas semanas, em especial do próprio presidente, eram de tolerância com o aumento de gastos, elevando a percepção de risco para a trajetória da dívida pública.
Foi positiva a fala de Lula, dizendo-se compromissado com a saúde das contas do país, mas resta saber se a postura será mantida ou se foi apenas um recuo estratégico. Pelo bem dos brasileiros, espera-se que a lição tenha sido assimilada.
Na mesma linha, o anúncio da revisão de gastos de R$ 25,9 bilhões em despesas com benefícios vai na direção correta. Mas possivelmente será insuficiente. Da mesma forma, aguardam-se novidades acerca de contingenciamentos para este ano. O crescimento de gastos obrigatórios, como os mínimos constitucionais e os vinculados ao aumento do salário mínimo, engessa o orçamento e diminui a margens de manobra. Isso também limita a capacidade de resposta a situações emergenciais, como o caso da tragédia climática no Rio Grande do Sul.