O caso de repercussão nacional ocorrido no sábado, na Capital, em que um motoboy agredido com uma faca acabou detido e algemado corrobora a importância do uso de câmeras corporais pelas forças policiais. Relatos de testemunhas e gravações feitas por populares indicam a possibilidade de uma conduta inadequada por parte dos brigadianos. Ao que parece, existiu um tratamento diferenciado, com rigor exagerado em relação ao motoboy e condescendência com o outro envolvido no episódio, um homem de 71 anos. Como a pessoa que fez o ataque com faca é branca e o motoboy é negro, de imediato associou-se a postura dos policiais militares (PMs) com o racismo incrustado na sociedade, preconceito que também pode se refletir na conduta policial.
O secretário de Segurança Pública do Estado, Sandro Caron, prometeu que a sindicância aberta pela Brigada Militar para avaliar o comportamento dos brigadianos terá conclusões em uma semana. A Polícia Civil informou ontem que ambos serão indiciados por lesão corporal. O motoboy teria atirado pedras no outro homem. A ocorrência de racismo ainda será apurada.
É uma tecnologia que dá transparência à ação policial, com ganhos para os agentes públicos e para a população
São investigações que devem transcorrer com técnica, sem prejulgamentos ou complacência. Esse é apenas um dos aspectos do episódio. Outra consequência deve ser alimentar o debate sobre melhor preparação e conscientização de agentes públicos da área de segurança quanto a abordagens dentro da legalidade e com respeito a direitos dos cidadãos.
O esclarecimento das circunstâncias da detenção do motoboy seria facilitado se os PMs estivessem usando câmeras corporais, com o registro de imagens e diálogos. Era o que poderia ter ocorrido se o governo gaúcho tivesse cumprido a promessa de implementar a adoção dos equipamentos ainda no ano passado. É preciso lembrar que abordagens, interação com o público, atendimento a ocorrências e mesmo ocasiões de conflito fazem parte do dia a dia da função policial. Nem sempre há fartos registros, como o caso do fim de semana, que mesmo assim requer melhor elucidação.
As câmeras corporais são comuns nos Estados Unidos, na Europa e vários Estados brasileiros já adotam ou estão em processo de aquisição, a exemplo do Rio Grande do Sul. É uma tecnologia que dá transparência à ação policial, com ganhos para os agentes públicos e para a população. Inibe abusos e desacatos. Quando é necessário, os registros podem ser requisitados pelo Ministério Público e pela Justiça para serem usados como prova e elemento de esclarecimento de fatos controversos. As imagens são inclusive meio de policiais comprovarem que, em determinada situação, agiram de acordo com os protocolos e no limite da lei.
Apesar da disposição para adotar os dispositivos na Brigada Militar e na Polícia Civil, o governo Eduardo Leite encontra sérias dificuldades para a finalizar a aquisição dos equipamentos. Duas licitações já foram abertas para a compra de mil dispositivos, mas até aqui acumulam-se frustrações devido a problemas de documentação das concorrentes e especificações descumpridas. Neste momento, o Estado avalia os equipamentos oferecidos pela quarta colocada da segunda licitação. O Piratini chegou a prometer que o uso começaria ainda no primeiro semestre do ano passado. Obviamente são necessários cuidados para uma aquisição criteriosa, com a garantia de que os equipamentos comprados terão a utilidade esperada. Mas a demora passa do razoável. Com benefícios para policiais e cidadãos, as câmeras corporais são um avanço civilizatório que tarda a ser empregado no Rio Grande do Sul.