Este espaço fez, no dia 1º de junho, alerta sobre a importância de o Estado se preparar melhor para enfrentar eventos climáticos extremos, como chuvas fortes e vendavais, a partir do aviso de organizações meteorológicas de que o El Niño estava prestes a voltar. Como é amplamente sabido, o fenômeno costuma fazer o Rio Grande do Sul ter períodos com maiores volumes de precipitações e tempestades mais frequentes. O intervalo entre o final do inverno e a primavera é considerado o mais crítico.
Os institutos de meteorologia emitiram avisos, mas mesmo assim muitos cidadãos foram surpreendidos pelas consequências da chuvarada
Na quinta e na sexta-feira da semana passada, o quadrante nordeste do território gaúcho foi atingido por um violento ciclone extratropical. Mesmo que a ocorrência não tenha relação com o El Niño, os desdobramentos são semelhantes aos que tendem a ser observados a partir das mudanças atmosféricas causadas pelo aquecimento das águas equatoriais do Oceano Pacífico. A chuva intensa e os ventos fortes deixaram quase 500 mil pontos sem energia elétrica, causaram inundações em dezenas de municípios e interromperam estradas por quedas de barreiras e de árvores, além de desalojar e desabrigar um grande contingente de pessoas devido às inundações. Mas, mais do que os contratempos usuais de dias de temporal, os eventos foram trágicos ao ponto de produzir ao menos 13 vítimas fatais, conforme as informações disponíveis até as 20h de domingo. Impõe-se lembrar que há especialistas advertindo para a possibilidade de um super El Niño se configurar no segundo semestre, potencializando os riscos.
O episódio, de significativa gravidade, reforça a necessidade de chamar a atenção do Estado – o que inclui governo gaúcho, municípios e empresas – para acelerar um planejamento relacionado a desastres naturais capaz de minimizar transtornos e prejuízos e evitar o risco de mais perdas de vidas. Os institutos de meteorologia, ainda no início da semana, emitiram avisos sobre a possibilidade de o Rio Grande do Sul ser fustigado pelo mau tempo, com volumes elevados de precipitações, mas mesmo assim muitos cidadãos foram surpreendidos pelas consequências da chuvarada. Órgãos públicos, da mesma forma, parecem não ter adotado as melhores providências.
Cientistas vêm reiterando que o mundo tende a sofrer cada vez mais com eventos climáticos extremos. Não é mais aceitável, portanto, ficar apenas contando com as chances de episódios semelhantes terem pouca força. Foi ilustrativo o apelo desesperado do prefeito de Maquiné, na noite de quinta-feira, suplicando que moradores abandonassem as suas casas e procurassem pontos mais altos do município. Àquela hora, a água já tomava conta da cidade.
Não há mais como prescindir de sistemas de alerta que, apoiados pela meteorologia, atualizem a população sobre níveis de risco. É preciso estabelecer protocolos e comunicá-los bem, para que funcionem quando for necessário. Municípios e Estado terão de reforçar e preparar melhor suas defesas civis para uma pronta resposta em caso de tempo severo. Obras urbanas que, dentro do possível, consigam minimizar alagamentos e enxurradas também são essenciais. Concessionárias de energia, sabedoras do período turbulento que tende a se avizinhar, devem se planejar desde já para uma grande demanda de chamadas para restabelecer o serviço em episódios de temporais.
Convém seguir insistindo ainda na necessidade de medidas estruturantes e de longo prazo, como uma política habitacional voltada a remover as famílias que vivem em áreas suscetíveis a inundações. São as pessoas humildes, como foi novamente observado agora no Estado, as mais vitimadas. Comumente, perdem para a água grande parte do pequeno patrimônio que amealharam ao longo de uma vida sofrida. Em nome destas, também se apela à solidariedade dos gaúchos, já engajados nas campanhas do agasalho, para amparar desalojados e desabrigados que tiveram de sair de casa às pressas, em muitos casos quase apenas com a roupa do corpo.