Mesmo que a cautela ainda persista, com a continuidade das projeções de desaceleração no segundo semestre, não é possível deixar de notar as boas surpresas da economia nacional no início do ano. Nos últimas dias, novas rodadas de indicadores divulgados pelo IBGE para a indústria, o comércio e os serviços vieram acima das projeções do mercado. Conhecido na sexta-feira, o IBC-Br, apurado pelo Banco Central (BC), seguiu a mesma toada e mostrou uma alta de 2,41% da atividade entre janeiro e março, ante o trimestre imediatamente anterior. Trata-se de uma notícia auspiciosa para o país, embora o ritmo acima do estimado amplie as dúvidas sobre quando o BC se sentirá confortável para começar a cortar a Taxa Selic.
É preciso criar as bases para que o Brasil seja capaz de produzir um crescimento mais robusto e duradouro
O desempenho, de qualquer forma, deflagrou uma onda de revisões do PIB de 2023 para cima pelas instituições financeiras. Já há casas com projeções se aproximando de 2%, aderentes até às estimativas do governo federal, obviamente sempre as mais otimistas. Apresentado semanalmente, o boletim Focus, do BC, comprova o tamanho da surpresa com os dados mais recentes. Na segunda-feira anterior, a mediana das apostas estava em 1,02%. Ontem, saltou para 1,20%, uma variação atípica por ser um indicador que costuma se mover de forma mais lenta, por representar opiniões de dezenas de instituições. Também divulgado ontem, o Monitor do PIB, da Fundação Getulio Vargas (FGV), apontou que, na passagem de fevereiro para março, a economia subiu 1,8%.
Há certo consenso de que parte significativa do crescimento da economia nesse início de ano se deve à grande safra agrícola no país e à resiliência do setor de serviços, o de maior peso no PIB. É preciso observar, à frente, o impacto dessas duas circunstâncias na inflação. A maior produção no campo, por um lado, ajuda a segurar os preços dos alimentos. O aquecimento dos serviços, entretanto, faz o contrapeso nessa equação. O Focus divulgado ontem mostrou ainda uma significativa redução da expectativa de inflação para 2023, de 6,03% para 5,8%.
Em um momento de desemprego ainda alto, com recuperação tímida da renda dos brasileiros, merecem ser celebradas as constatações de que o país consegue imprimir na economia uma cadência acima da expectativa geral. Ainda assim, é preciso ressaltar que, mesmo que o PIB acabe avançando em torno de 2%, é um desempenho muito aquém do necessário, tendo em vista os muitos anos recentes de recessão e crescimento pífio. Para elevar esse potencial, há agendas a serem enfrentadas, como a da educação, a da reforma tributária e a da produtividade. Outra é a da sustentabilidade das contas públicas.
A Câmara dos Deputados deve votar nesta semana o novo marco fiscal. Ainda pairam dúvidas sobre a eficácia do substituto do teto de gastos, principalmente devido a recentes alterações que ampliam a margem para despesas. O país precisa de um mecanismo que produza credibilidade e ajude a gerar condições para o BC dar início a um novo ciclo de redução do juro básico, ora em escorchantes 13,75% ao ano. Não há como contar sempre com novas surpresas positivas na economia. É preciso criar as bases para que o Brasil seja capaz de produzir um crescimento mais robusto e duradouro.