Ex-procurador da República, ex-coordenador da força-tarefa da Operação Lava-Jato e candidato mais votado do Paraná nas últimas eleições legislativas, com 344 mil votos, o deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR) teve seu mandato cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na última terça-feira, por infração à Lei da Ficha Limpa. Pelo entendimento unânime dos juízes do TSE, o fato de o parlamentar ter se demitido do cargo de procurador para concorrer a cargo eletivo quando ainda respondia a procedimentos disciplinares internos no âmbito do Ministério Público o tornava inelegível. Os sete ministros da Corte eleitoral concluíram que ele tentou fraudar a lei ao pedir exoneração quando era alvo de acusações que poderiam se transformar em processos administrativos disciplinares. Integrantes do Ministério Público com PADs pendentes tornam-se inelegíveis.
Ao mesmo tempo em que provoca controvérsias jurídicas, a cassação do deputado paranaense reacende também a polarização política nacional
Ao mesmo tempo em que provoca controvérsias jurídicas, a cassação do deputado paranaense reacende também a polarização política nacional, uma vez que ele foi um dos grandes artífices da condenação de réus da Operação Lava-Jato, em especial do processo que culminou com a prisão do atual presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. Petistas e partidários do mandatário não esquecem e não perdoam o protagonismo de Deltan Dallagnol nas acusações a seus líderes, com ênfase na célebre apresentação de PowerPoint que apontou Lula como chefe de uma organização criminosa formada para fraudar o Estado brasileiro. O próprio presidente está processando o ex-procurador pelo episódio, já tendo obtido uma vitória na Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que sentenciou Deltan a indenizá-lo por dano moral.
Nesse contexto, não é de estranhar que eleitores e simpatizantes do deputado cassado vejam o recente julgamento como ato de vingança e perseguição política ao homem que se notabilizou, perante parcela expressiva da opinião pública, como um paladino do combate à corrupção no país. Essa interpretação também está sendo oportunisticamente adotada por políticos de oposição, como forma de levantar suspeitas sobre os atuais governantes.
Ainda que o julgamento do TSE tenha ocorrido em circunstâncias atípicas para um caso de tamanha repercussão – numa sessão de poucos minutos, sem debate e pedidos de vista –, é inquestionável – como diz o adágio popular – que a decisão judicial tem de ser cumprida. Se o réu se julga injustiçado, ele ainda pode recorrer à instância superior. Mais do que isso: pode continuar manifestando publicamente sua contrariedade, como, aliás, vem fazendo, porque vivemos num regime de plena liberdade de expressão.
O importante, neste caso e em todos os demais, é que o Poder Judiciário aja com autonomia e respeito à Constituição. Se a cassação foi excessiva, caberá ao STF corrigir. Só não é cabível disseminar reiteradas suspeitas sobre a imparcialidade dos Tribunais, que, obviamente, também erram e acertam nos seus julgamentos.
Ninguém é infalível. Mas aqueles que agem de boa-fé e se guiam pelas regras da democracia têm maior probabilidade de acertar, pois o regime de liberdades – ao contrário do autoritarismo – sempre permite corrigir equívocos e injustiças.