Protagonista de um rumoroso episódio de preconceito explícito no mês de fevereiro, logo após o resgate de safristas da colheita da uva de trabalho análogo à escravidão na serra gaúcha, o vereador caxiense Sandro Fantinel (sem partido) pediu desculpas pela declaração infeliz e teve seu mandato preservado por seus pares, mas ainda demonstra certa dificuldade para entender todo o contexto do seu julgamento. É o que se pode concluir da entrevista que o parlamentar concedeu à Rádio Gaúcha ontem, quando repetiu seu ato de contrição, mas insinuou que a imprensa teria dado maior ênfase a seu erro do que a seu arrependimento.
É positivo que o vereador assuma sua culpa e comprometa-se com uma mudança efetiva de comportamento. Seria bom que ele também revisasse seu olhar sobre a imprensa, que trabalha com fatos e procura oferecê-los com o máximo de objetividade para a avaliação do público. Não foi outro o critério utilizado na divulgação do discurso em que o senhor Fantinel acusou os baianos de “viverem na praia tocando tambor” e sugeriu que as empresas da região contratassem argentinos, que “são limpos, corretos e cumprem horário”. Foi por isso – e não pela ação da imprensa – que cidadãos e autoridades da Bahia se sentiram ofendidos. Também foi pelo tom discriminatório do discurso que os gaúchos ficaram constrangidos e os próprios companheiros do parlamentar cogitaram afastá-lo de suas atribuições.
Resta esperar, agora, que o político reflita mais antes de falar e confirme seu arrependimento com ações práticas no restante de seu mandato, honrando assim os votos daqueles que o elegeram
A imprensa profissional acompanhou com a atenção devida todos os desdobramentos do episódio, procurando sempre observar o princípio ético da separação entre informação e opinião. Ouviu todas as partes e divulgou as diversas visões para suas audiências. Evidentemente, também opinou, por comentaristas capacitados e nos espaços apropriados para isso, até mesmo porque seria uma omissão imperdoável não se posicionar numa cobertura que envolve exploração humana e desrespeito aos direitos humanos.
Assim transcorreu também nos últimos dias o acompanhamento do julgamento político do vereador, que teve 13 votos de seus pares pela cassação de seu mandato e nove pela manutenção. Como seriam necessários dois terços dos votos da Câmara para o afastamento do parlamentar, ele continua no cargo. E a decisão colegiada tem que ser aceita. Resta esperar, agora, que o político reflita mais antes de falar e confirme seu arrependimento com ações práticas no restante de seu mandato, honrando assim os votos daqueles que o elegeram e representando dignamente a população do seu município em toda a sua diversidade.
O próprio parlamentar vem reafirmando em diversas entrevistas que a população de Caxias é contrária à intolerância, à discriminação e ao racismo, mas enfatiza que também é contrária à injustiça. Acredita que, por isso, não foi cassado. Sua posição pode ser questionável, mas merece ser respeitada – da mesma forma que merecem respeito os veículos e os profissionais de imprensa que divulgam notícias de interesse público e ajudam os cidadãos a se municiarem de informações transparentes para que eles próprios façam seus julgamentos sobre seus representantes. Talvez o senhor Fantinel não perceba, mas a imprensa também é julgada diariamente pela opinião pública, que costuma premiar com sua atenção e sua audiência a isenção, a objetividade, o pluralismo de visões e, principalmente, a verdade.