Enfim, após amplas análises e duras negociações, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, apresentou ontem o novo marco fiscal, que substituirá o teto de gastos e será a âncora das contas públicas nos próximos anos. Os detalhes da proposta ainda serão mais bem conhecidos e debatidos, o que permitirá uma avaliação mais profunda de seus méritos e do que poderá ser corrigido. Mas as primeiras repercussões foram majoritariamente positivas, refletindo-se na alta do mercado acionário e na queda do dólar e dos juros futuros.
Regra fiscal responsável, com a entrega dos resultados previstos, é o ponto de partida para um período de crescimento econômico mais duradouro
O texto será agora enviado ao Congresso para discussão e as lideranças do parlamento se comprometeram a levar a matéria ao plenário ainda em abril. Do Senado e da Câmara, espera-se uma análise madura do novo arcabouço e os aperfeiçoamentos necessários, que contribuam para o objetivo perseguido de sinalizar ao menos a estabilização da dívida pública em relação ao PIB a partir de 2026.
Um marco fiscal robusto e crível é o que o país precisa para apontar para a responsabilidade e a previsibilidade nos próximos anos. Ao consolidar esta percepção, o mercado tende a diminuir as expectativas de inflação. Esse é um dos elementos que os membros do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) vêm citando como essenciais para que, nos próximos meses, exista segurança para começar um novo ciclo de corte da taxa Selic, o que abriria perspectiva de reação da economia mais à frente. Deve-se observar que, se o texto – que vai ao Congresso em forma de projeto de lei complementar – for mesmo aprovado ainda em abril, o Copom poderia incorporá-lo em seus cenários para a próxima reunião, marcada para os dias 2 e 3 de maio.
Entre os principais pontos apresentados ontem por Haddad e pela ministra do Planejamento, Simone Tebet, está o compromisso de que a despesa poderá crescer até o equivalente a 70% do avanço das receitas. Há ainda a intenção de entregar neste ano um déficit de 0,5% do PIB, ante um rombo anteriormente projetado de 1%. O plano é zerar o déficit em 2024 e o país voltar a ter superávits a partir de 2025. É preciso observar, no entanto, que o governo espera que grande parte do equilíbrio venha do aumento da arrecadação. Seria preciso compreender melhor como isso ocorreria e, tão importante, ter mais detalhes também sobre como as despesas serão contidas.
O novo marco fiscal foi um dos compromissos dos integrantes do novo governo, ainda antes de Lula tomar posse, como contrapartida à aprovação da PEC da Transição, que deu espaço para o governo elevar desembolsos sociais e investimentos, uma vez que o teto de gastos, que limitava o crescimento das despesas à inflação, era considerado rígido demais pela nova gestão. Será necessário, depois, que a sociedade permaneça atenta ao cumprimento dos esforços prometidos. Não basta ter boas normas. É indispensável implementá-las e segui-las à risca, a despeito das flexibilidades previstas. Uma regra fiscal responsável, com a entrega dos resultados previstos, cria credibilidade e é o ponto de partida para o país elevar as chances de iniciar um período de crescimento econômico mais duradouro e potencialmente maior, com juros mais baixos e inflação controlada.