A descoberta de um artefato explosivo num caminhão de combustível nas proximidades do aeroporto de Brasília acrescenta um elemento novo – e preocupante – no tenso ambiente de transição de governo no país. De acordo com o relato da Polícia Civil do Distrito Federal, o principal responsável pelo frustrado atentado é um empresário do Pará, apoiador do presidente Jair Bolsonaro, que foi preso e já teria confessado sua intenção de provocar um incidente capaz de motivar estado de sítio no país e intervenção das Forças Armadas. Embora o episódio ainda não tenha sido suficientemente investigado, principalmente para que também sejam responsabilizados eventuais cúmplices e financiadores da tresloucada ação, não há dúvida de que os limites da lei e do bom senso foram ultrapassados.
Da mesma forma como as manifestações “patrióticas” de grupos inconformados com o resultado eleitoral ainda são vistas com certo deboche por quem não as leva a sério, o incidente do último final de semana até pode passar a impressão de amadorismo. Mas não é inconsequente. Pelo contrário, escancara o risco real de violência e de ameaça à normalidade institucional.
O ensaio de terrorismo acende um sinal de alerta
Estimulado pela cultura do armamentismo e, segundo seu primeiro depoimento, por manifestações públicas do atual mandatário da nação, o empresário, que tem registro de CAC (colecionador, atirador e caçador), mantinha no seu endereço de Brasília um verdadeiro arsenal: pistolas, revólveres, fuzis, carabinas, munições e mais cinco emulsões para fabricar explosivos. Sua intenção – ainda de acordo com as primeiras informações da Polícia Civil – era explodir a bomba no estacionamento do aeroporto ou numa subestação de energia, para provocar o caos e a apregoada intervenção das Forças Armadas.
O ensaio de terrorismo acende um preocupante sinal de alerta que não deve resultar apenas no reforço no esquema de segurança das autoridades e do público para a cerimônia de posse do presidente eleito. Requer, paralelamente, uma investigação mais aprofundada, capaz de prevenir potenciais aventuras radicais. Talvez tenha também chegado a hora de ações efetivas das autoridades policiais e até mesmo das corporações militares no sentido de desmobilizar ajuntamentos de civis em frente aos quartéis. O ato criminoso abortado pela Polícia Civil de Brasília aumenta a suspeita de que tais aglomerações, compostas em muitos casos por cidadãos ingênuos e preocupados com os rumos políticos do país, estejam servindo de base para delinquentes perigosos e armados. Estimulados pela negligência das autoridades, pela cobertura involuntária de pessoas pouco comprometidas com a democracia e alimentados pela desinformação ou por interesses escusos, esses indivíduos se julgam imunes para praticar ações violentas. Têm que ser contidos.
A irresignação com o resultado eleitoral só é legítima quando praticada de acordo com o preceito mais elementar da democracia: a maioria elege o governante e a parte vencida se organiza para fiscalizar, fazer oposição e se preparar para o próximo pleito. Simples assim. Explodir coisas não faz parte do jogo democrático. É crime.