Sempre que um serviço público essencial passa para a administração privada, os contribuintes são tomados por duas preocupações plenamente justificadas: a possível elevação do preço das tarifas e a qualidade do atendimento à população. Esses aspectos foram debatidos e esclarecidos na entrevista concedida à Rádio Gaúcha pelo vice-presidente da Aegea, holding que arrematou a Companhia Riograndense de Saneamento em leilão realizado na última terça-feira, na B3, a bolsa de valores oficial do Brasil, em São Paulo.
O fundamental é que o tabu foi superado graças à visão pragmática do atual governo e à compreensão da Assembleia
Embora a assinatura do contrato ainda dependa de decisões judiciais, a desestatização da companhia que fornece água e saneamento para mais de 300 municípios gaúchos representa um avanço no sistema de concessões e habilita o Rio Grande do Sul para o atendimento do Novo Marco Legal do Saneamento no país, que estabelece o ano de 2033 para a universalização dos serviços de água e esgoto. Se fosse mantido o modelo atual – público –, o Estado não teria recursos para cumprir o plano de investimentos da companhia e dificilmente poderia expandir a prestação dos serviços para a parcela da população ainda desassistida.
Vai custar mais caro ter água e esgoto de qualidade no Rio Grande do Sul? Como bem esclareceu o vice-presidente da Aegea, Leandro Marin, as empresas concessionárias de serviço público não detêm o poder de definir as tarifas por conta própria. Estão submetidas a regras bem definidas e ao controle das agências reguladoras. Por isso, a atenção dos contribuintes deve se voltar para a Agência Nacional de Águas (ANA) e para a Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados no Rio Grande do Sul (Agergs), que precisam atuar tecnicamente para que os valores cobrados sejam corrigidos pela inflação, como se comprometeram as partes envolvidas no processo de privatização.
Por ser a primeira privatização de uma companhia estadual de saneamento no país, a transferência da administração da Corsan para o consórcio Aegea está sendo acompanhada com lupa por outras unidades da Federação que também têm dificuldades para cumprir as metas do Novo Marco Legal do Saneamento. A legislação federal determina que, dentro de 10 anos, 99% da população brasileira tenha acesso à água potável e 90% à coleta e ao tratamento de esgoto. No caso do RS, será necessário um investimento estimado em R$ 13 bilhões para garantir eficiência operacional e atendimento à população. Não havia, portanto, alternativa mais sensata e viável do que a concessão.
Ninguém ignora que alguns obstáculos ainda precisam ser removidos, entre os quais estão o litígio jurídico com as prefeituras que se recusam a participar do acordo e a resistência de parte dos trabalhadores da companhia, especialmente por causa da deficitária Fundação Corsan, que dá assistência previdenciária aos funcionários. São questões importantes, mas que podem ser resolvidas com diálogo e bom senso de parte a parte.
O fundamental é que o tabu foi superado graças à visão pragmática do atual governo e à compreensão da Assembleia Legislativa, que debateu exaustivamente o projeto e autorizou a privatização. Num momento de revisão do papel social do Estado, o Rio Grande dá um bom exemplo ao país.