A recente divulgação dos resultados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) trouxe uma informação alarmante. Foram as crianças em fase de alfabetização que tiveram os maiores prejuízos na aprendizagem no ano passado. São as sequelas da pandemia aparecendo. A aferição mostrou que alunos de oito anos, idealmente já aptos a ler e escrever com naturalidade, tinham dificuldades de localizar informações claras em um texto de apenas duas linhas.
Como essa é uma etapa essencial para a trajetória escolar, é uma deficiência que tem de ser atacada logo
Como essa é uma etapa essencial para a trajetória escolar, é uma deficiência que tem de ser atacada logo. Neste contexto, acerta o governo gaúcho ao anunciar a criação de um programa voltado exatamente para a finalidade de alfabetizar os estudantes das redes do Estado e dos municípios até o encerramento do 2º ano do Ensino Fundamental. É uma frente que pede respostas urgentes e, portanto, o esperado é que o futuro governo, a ser definido nas eleições do próximo mês, mantenha o foco nesse tema.
Batizado de Alfabetiza Tchê, o programa começa com uma prova de avaliação dos estudantes, seguida da elaboração de materiais didáticos para ajudar os professores a solucionar os obstáculos ao letramento infantil. Estão previstos ainda apoio à formação dos docentes e monitoramento dos indicadores, avaliando o progresso do projeto. A premiação em dinheiro para as escolas com melhor desempenho deve servir como incentivo extra para que atinjam os objetivos. Também faz sentido ajudar financeiramente os colégios com os piores resultados, como forma de auxílio, em busca de melhorar a aprendizagem dos pequenos do 1º e 2º anos do Ensino Fundamental. Mas, mais do que o ato mecânico de ler e escrever, é preciso trabalhar também para combater o analfabetismo funcional, quando a pessoa tem dificuldade de compreender e dar sentido ao que está escrito.
O fato de o programa ter sido elaborado em parceria com a Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul e a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação depõe a favor da iniciativa. Mostra que há uma busca conjunta para reverter o quadro atual.
A Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs) também apresentou dados nessa semana que escancaram a dificuldade do setor em encontrar mão de obra qualificada para contratar. Dois terços das empresas relatam enfrentar esse gargalo. O sufoco é maior para recrutar em áreas como produção (técnicos e operadores), pesquisa e desenvolvimento, vendas e marketing. A qualificação de um trabalhador é um processo contínuo. Tudo se inicia, por óbvio, no começo da vida escolar, quando se aprende a ler e a escrever. Ter essas habilidades básicas permite, nos anos seguintes, melhores condições de acumular outros conhecimentos. Isso se refletirá na vida adulta, quando chegar ao mercado de trabalho.
Um dos entraves econômicos do país é a estagnação da produtividade do capital humano. Nesse jogo, capacitação é a palavra-chave. E a indústria é um dos setores que, com a incorporação constante de novas tecnologias, mais requerem pessoas com boa formação, treinadas para estas várias tarefas e com capacidade de se adaptar às transformações. Em regra, inclusive, remunera melhor ante outros segmentos da economia. Apostar em uma melhor alfabetização, portanto, também significa dar o lastro necessário para que crianças se transformem em cidadãos com maiores chances de construir uma trajetória profissional digna.