Quando se fala sobre a proteção aos biomas existentes no Brasil, logo vem à mente a situação da Amazônia, do Pantanal, do Cerrado e da Mata Atlântica. O Pampa, por não ter fauna e flora tão exuberantes e ser restrito ao Rio Grande do Sul no país, não costuma ser alvo de igual atenção. Mas, como grande patrimônio natural do Estado e onde também é possível conciliar preservação e atividade econômica, merece uma atenção especial dos gaúchos. Levantamento do projeto MapBiomas divulgado ontem e que mostra a redução do ambiente natural entre 1985 e 2020 é uma nova oportunidade para reflexões e aprofundamento dos debates.
A questão que se impõe é a necessidade de proteger os ambientes naturais e a biodiversidade do Rio Grande do Sul, sem frear o progresso
O trabalho indica que, nesse intervalo de tempo, 21,4% da vegetação nativa foi suprimida, o maior percentual entre os biomas brasileiros. Predominantes, as formações campestres, por sua vez, representavam 46,2% da área 36 anos atrás e, agora, apenas 32,6%. São 2,6 milhões de hectares a menos. O levantamento, executado por meio de equipes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da empresa de tecnologia da informação GeoKarten, aponta que grande parte desse território com uso modificado foi ocupado por lavouras, especialmente de soja.
A conversão das planícies e coxilhas a perder de vista para o uso na agricultura não é novidade. É um fenômeno que se acelerou nas últimas duas décadas, quando a China surgiu no cenário mundial com grande apetite pela oleaginosa. As zonas de plantio, que se concentravam em maior proporção no norte do Estado, se estenderam para a Metade Sul, onde predominam as áreas de pampa. É resultado, sobretudo, da remuneração muito superior da cultura da soja na comparação com a pecuária extensiva, atividade tradicional e que teve grande colaboração para forjar a figura do gaúcho.
A questão que se impõe é a necessidade de proteger os ambientes naturais e a biodiversidade, sem frear o progresso. É cada vez maior, em todo o mundo, a busca por modelos de desenvolvimento que conciliem atividades econômicas e preservação. E uma vocação natural do bioma presente no Estado é a pecuária. Há, hoje, uma série de legislações e normas, federais e estaduais, que tornam mais rigorosa a possibilidade de autorização para conversão do uso do solo nas áreas de campos naturais do bioma Pampa, transformando-as em lavouras, por exemplo.
Uma alternativa a ser trabalhada é a agregação de valor à carne produzida de animais alimentados basicamente em pastagens nativas. Sem dispensar a incorporação de novas tecnologias e sistemas de manejo avançados para elevar a produtividade. Junto a isso, criar e consolidar uma espécie de marca do Rio Grande do Sul. Existem iniciativas nesse sentido, mas não há dúvida de que o potencial a ser explorado é imenso, pela preocupação cada vez maior do consumidor em procurar alimentos que unam preservação ao processo produtivo. É o típico caso em que políticas públicas e empreendedorismo precisam atuar de forma coordenada. Ganha a economia gaúcha, enquanto a natureza agradece, com a proteção a um patrimônio afetivo e natural do Estado.