As consequências do aquecimento global, como o aumento da frequência de eventos climáticos extremos, não são uma ameaça para o futuro. São, neste momento, sentidas em várias partes do mundo, como a seca severa que atinge grande parte do Brasil, os recordes de calor no Canadá e as enxurradas que varreram diversas cidades da Alemanha e da China. Os alertas sobre a urgência de providências globais coordenadas aparecem de forma contundente no relatório divulgado no início da semana passada pelo Painel Intergovernamental sobre o Clima (IPCC), da Organização das Nações Unidas (ONU), elaborado por mais de 200 cientistas de 66 países, inclusive do Brasil.
É uma realidade que bate hoje à porta da humanidade e uma questão, no limite, que trata do grau de hostilidade que as gerações seguintes encontrarão na Terra
Categórico, o estudo conclui ser irrefutável que as ações do homem estão por trás de mudanças climáticas sem precedente, irreversíveis e inevitáveis. Assim, não seria mais possível paralisar esta marcha de transformações atmosféricas, mas no máximo mitigá-la. Febril, o planeta pede socorro, na forma de ações coordenadas do poder público, da sociedade e de cada cidadão para reduzir a emissão de gases causadores do efeito estufa e impedir aumento ainda maior das temperaturas nas próximas décadas, com reflexos potencialmente catastróficos para a humanidade.
Os cenários previstos para o mundo, para o Brasil e para a região onde fica o Rio Grande do Sul são preocupantes. Em grande parte do país, há tendência de aumento de episódios de secas, o que seria um desastre para o agronegócio e a produção de alimentos, com reflexos inequívocos no PIB. Para o Estado, maiores temperaturas e chuvas mais recorrentes levariam a inundações, com uma espécie de tropicalização do clima local, gerando um cenário mais propício para doenças de relativa baixa prevalência no território gaúcho. Tragédias climáticas, é preciso ressaltar, costumam atingir mais as populações vulneráveis.
Evitar as mais dramáticas conjunturas requer um grande esforço para cumprir as metas de redução de gases poluentes pelo mundo estabelecidas pelo Acordo de Paris. Mas a janela para isso ser possível, alerta o documento, é mais estreita a cada dia. O limite de aumento de 1,5ºC de aquecimento global a partir da era pré-industrial, estimam agora os cientistas, pode ser alcançado em 2030, uma década antes do previsto anteriormente.
No caso do Brasil, a mais premente tarefa, essencialmente a cargo do governo federal, tanto em medidas quanto na mudança de discurso, é deter o desmatamento da Amazônia. Mas o empenho deve ser de cada Estado e cidade, na busca por uma mudança de modelo econômico e energético. Essa conversão, no entanto, merece ser encarada não como uma ameaça, mas como uma chance a ser aproveitada. O desafio de buscar formas de viver e produzir de maneira mais sustentável abre inúmeras oportunidades pela agregação de valor, geração de novas tecnologias e inovação rumo a uma economia de baixo carbono. O Brasil é referência em várias dessas áreas, mas precisa ter lideranças sensatas que compreendam o alerta, não tratem as conclusões do painel como mero alarmismo e trabalhem para que o país, para benefício próprio e do mundo, se engaje de maneira ordenada neste objetivo.
A conferência sobre o clima marcada para Glasgow, na Escócia, em novembro, é uma chance para formar consensos em torno de metas mais ambiciosas. Não se trata de uma questão ideológica, abstrata e distante. É uma realidade que bate hoje à porta da humanidade e uma questão, no limite, que trata do grau de hostilidade que as gerações seguintes encontrarão na Terra.