Célere quando se trata de legislar em causa própria, a Câmara dos Deputados se moveu na noite de quarta-feira na direção de promover um retrocesso no processo de depuração partidária ao aprovar o retorno das coligações proporcionais. A regra, abolida na minirreforma de 2017, valeu apenas para o pleito municipal do ano passado, mas agora parte do parlamento pretende patrocinar a volta de uma norma que apenas favorecia a transformação de partidos nanicos em balcão de negócios.
Um dos grandes males do sistema político nacional é a profusão de legendas sem qualquer clareza ideológica ou identidade programática
Um dos grandes males do sistema político nacional é a profusão de legendas sem qualquer clareza ideológica ou identidade programática. Virou uma espécie de empreendimento criar siglas que viram partidos de aluguel com acesso a recursos públicos e que barganham com outras agremiações maiores seus espaços nos horários gratuitos de rádio e TV, além do apoio em troca de cargos e verbas. Com as coligações nos pleitos aos Legislativos, acabavam se aproveitando do desempenho dos partidos mais representativos para garantir espaços nos parlamentos, dando continuidade a uma dinâmica que, ao fim, não tem como objetivo solucionar problemas ou oferecer caminhos ao país ou aos Estados e municípios.
Ficou claro agora que a proposta do chamado "distritão", considerado por inúmeros cientistas políticos como o pior sistema eleitoral existente, era apenas o que se convencionou chamar de bode na sala na votação convocada às pressas pelo presidente da Câmara, Arthur Lira. O comandante da Casa, aliás, tem se notabilizado como um mestre em passar o trator na hora de escolher pautas que têm interesse do centrão, sem que se aprofundem discussões no próprio parlamento ou na sociedade. O acordo para evitar o "distritão", que incentivaria o personalismo e dificultaria a renovação, abriu as portas para, na noite de quarta-feira, em primeiro turno, uma aprovação mais tranquila da volta das coligações proporcionais, desejo de alguns caciques influentes, garantindo a sobrevivência de partidos que não têm sentido de existência.
De acordo com a Associação Brasileira de Ciência Política, os efeitos da minirreforma de 2017 já apareceram de forma positiva nas eleições do ano passado, com a redução da fragmentação partidária nos Legislativos municipais, sem afetar a representação das minorias. Espera-se que, após a votação no segundo turno na Câmara, da análise dos destaques e da apreciação de outros pontos da PEC da Reforma Eleitoral, a ideia da volta das coligações seja barrada no Senado. É preciso deter o retrocesso.