É estarrecedora a descoberta de que cerca de 230 mil pessoas no país, além de outros 23 mil brasileiros que vivem no Exterior, podem ter recebido ilegalmente recursos do auxílio emergencial, pago pelo governo federal para ajudar trabalhadores informais, autônomos e desempregados durante o momento mais crítico da pandemia. A revelação, feita no programa Fantástico, da Rede Globo, no último domingo, mostra a existência de sérias fragilidades na análise sobre quem pode ou não ter acesso ao dinheiro, o que precisa ser urgentemente corrigido. Enquanto centenas de milhares que deveriam estar excluídos conseguem os R$ 600, também proliferam relatos de cidadãos que estão enquadrados nas normas como possíveis beneficiários, mas têm resposta negativa na hora de buscar o amparo financeiro.
Choca especialmente a informação de que mais de 27 mil foragidos da Justiça, em todo o Brasil, tiveram o benefício aprovado
Choca especialmente a informação de que mais de 27 mil foragidos da Justiça, em todo o Brasil, tiveram o auxílio emergencial aprovado e, apenas na primeira parcela da ajuda, foram agraciados com R$ 16 milhões. Destes não se esperava que deixassem de agir de má-fé, mas seria preciso um mínimo de controle do governo e da Caixa sobre o banco de dados e um cruzamento de informações com outros órgãos para detectar a presença de criminosos na lista de candidatos a receber os recursos. Outra falha já detectada foi a que permitiu a mais de 70 mil militares das Forças Armadas sacarem o valor, que deverá ser devolvido, conforme ordem do Tribunal de Contas da União (TCU).
O grave é que não são criminosos comuns apenas os que buscam perpetrar essa fraude. Onze dos 22 bandidos mais procurados do país, conforme relação do Ministério da Justiça e da Segurança Pública, solicitaram e conseguiram os recursos que deveriam ser direcionados para brasileiros humildes e trabalhadores. A ameaça de enquadrar tais elementos – que já deveriam estar atrás das grades – em crimes como estelionato e falsidade ideológica tampouco serve para inibir a ação desses delinquentes. Afinal, no rol dos mais procurados figuram bandidos condenados por roubos milionários, tráfico de drogas e outras transgressões pesadas.
A melhor alternativa para solucionar este problema sério é aperfeiçoar o sistema de filtros dos que pedem o benefício, com um cruzamento com os bancos de dados do Conselho Nacional de Justiça, para detectar a presença de foragidos, e da Receita Federal e Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para outros casos, como quem vai morar no Exterior. O TCU, em boa hora, está pedindo esclarecimentos do governo federal para estancar essa sangria de recursos, que acontece ao mesmo tempo que laboriosos brasileiros ainda lutam de forma desesperada pela sobrevivência em meio ao caos em que se transformou a economia com a chegada do novo coronavírus. Custoso e meritório, o auxílio emergencial ampara quase 60 milhões de brasileiros neste período de maior incerteza. Mesmo que as fraudes sejam minoritárias, é preciso estabelecer um melhor controle para detectar rapidamente quem não se enquadra e agilizar a inclusão dos cidadãos que têm direito ao benefício.