Todo desvio de dinheiro público é abominável, deve ser investigado e punido. Mas não há forma mais sórdida de se apropriar de recursos oriundos do trabalhado árduo dos brasileiros do que perpetrar este crime na área da saúde, ainda mais em pleno evento considerado a maior emergência sanitária em um século. A crise do coronavírus, que já vitimou cerca de 25 mil pessoas no país, é repulsivamente usada por grupos inescrupulosos, muitas vezes com a participação de gestores públicos, que enxergam no desespero pela aquisição de equipamentos e montagem de estruturas necessárias para o enfrentamento da epidemia a oportunidade perfeita para assaltar o erário. Escassas verbas que deveriam ser empregadas na tarefa de salvar vidas, atendendo pacientes na ponta, acabam no bolso de patifes. Descobertos, devem merecer todos os rigores previstos em lei.
Escassas verbas que deveriam ser empregadas na tarefa de salvar vidas, atendendo pacientes na ponta, acabam no bolso de patifes
A área da saúde é especialmente atraente para corruptos e corruptores por lidar com grandes somas e ter contratos pulverizados. Uma legislação federal aprovada no início de fevereiro liberou de licitação a compra de serviços e produtos destinados ao combate do coronavírus. Foi uma medida necessária em nome da agilidade, mas que parece que também vem sendo usada, infelizmente, para facilitar malfeitos. Fazem bem os organismos fiscalizadores e policiais que mostram-se atentos para detectar e flagrar as fraudes.
Ainda que pairem dúvidas sobre eventual motivação de fundo político, a ação desencadeada na terça-feira contra empresários e integrantes do governo do Rio não é resultado apenas da ação da Polícia Federal, mas de outros órgãos, como a própria Polícia Civil fluminense e o Ministério Público Federal (MPF), com o aval do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que analisou o caso e autorizou a operação. Com ou sem o envolvimento do governador Wilson Witzel no conluio, o que deve ser rapidamente esclarecido, o fato é que os desvios verificados não podem ficar sem as devidas sanções legais. Não são poucos, aliás, os episódios suspeitos em outros Estados. São situações que precisam ser aclaradas, seja qual for o partido no poder ou o grau de simpatia entre o governador e o presidente Jair Bolsonaro.
Da mesma forma, merece aplauso a operação deflagrada ontem que, no Rio Grande do Sul, com uma exemplar colaboração entre órgãos e instâncias estaduais e federais, desnudou um caso de desvios na área de saúde em Rio Pardo, com possível participação do prefeito. As investigações devem seguir e, se comprovadas as suspeitas, é preciso chegar à responsabilização e a punições pedagógicas para as duas pontas do suposto esquema de corrupção, desestimulando novas falcatruas do gênero, que, além de desonestidade, demonstram uma assombrosa frieza e desprezo pela vida dos cidadãos.