Por Pedro Dutra Fonseca, professor titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS
A desvalorização do real no ano supera os 12%, o que nem os mais pessimistas previam. Contribuem para isso causas externas e internas. As primeiras dizem respeito ao baixo crescimento e às incertezas das economias líderes, com o conflito comercial sino-americano, o Brexit e, agora, o coronavírus. Mas o pano de fundo é o dólar continuar como a divisa internacional por excelência, a reserva de valor em conjunturas adversas. Assim, é a única moeda com a propriedade de se valorizar nas crises. Isso explica por que o real se deprecia, mas não a magnitude nem sua volatilidade: a desvalorização no ano só perde na América Latina para a Venezuela. Supera até o peso argentino, mesmo com a volta do peronismo temido pelo mercado.
O cotejo com outros países remete aos fatores locais: o fraco desempenho do setor externo, o baixo crescimento e a política. Só, nenhum deles assusta, mas os três juntos se realimentam. O déficit em transações correntes foi de US$ 11,8 bilhões em janeiro e tende a fechar o trimestre como o maior em cinco anos. As exportações não reagem, mesmo com a desvalorização cambial. Isso complica a tese de que a competitividade da indústria se resolve com câmbio. O déficit poderia ser coberto com entrada de capitais externos por duas alternativas: investimentos diretos (para produzir) ou na conta financeira. Mas esta perdeu o atrativo com os juros baixos. E os primeiros, cerca de US$ 5 bilhões, não cobrem nem a metade da defasagem.
O baixo crescimento torna-se causa e consequência: produzir para quem? Além disso, como o ministro Guedes presenciou em Davos, a imagem do Brasil é arranhada pelo radicalismo político, que ninguém sabe aonde chegará. E pela política externa, chegando ao ponto de, irritado, pedir a cabeça do colega responsável pela área. Ele cumpre o dever de passar tranquilidade, acena para as reformas, mas sabe que o nó é mais complicado. Dado a arroubos verbais, mais um – brincadeira? – foi sugerir aproveitar o dólar caro para substituir importações. O empresário, ao investir, olha para o câmbio de longo prazo, flutuações abruptas só atrapalham. Ele mesmo há pouco sinalizou o contrário, ao abrir as compras do governo a empresas do Exterior. Meu conselho é ser conservador e não querer estancar a alta vendendo reservas, pois é o trunfo que nos resta.