Ainda que tardia e restrita a futuros servidores públicos, a reforma administrativa deve ser finalmente encaminhada ao Congresso nesta semana pelo governo Bolsonaro. É um pequeno alento, embora, pela envergadura do problema, incapaz de equacionar a questão de fundo: o engessamento e o custo da máquina pública drenam investimentos que deveriam ir para infraestrutura, educação, saúde e segurança, e mantêm a passo de tartaruga a execução de programas de revitalização da economia.
Esse cenário é injusto para o Brasil e para os próprios funcionários, que deixam de aproveitar oportunidades oferecidas pelo moderno mundo do trabalho
À luz de perspectivas globais, as distorções no setor público brasileiro são de um exotismo financeiro desconhecido mesmo em países que já chegaram ao Primeiro Mundo. Entre 2003 e 2018, por exemplo, o número de servidores na administração federal passou de 532 mil para 712 mil, um aumento de 34%, contra 15% de crescimento da população, segundo levantamento do jornal Folha de S. Paulo. Não bastasse o evidente inchaço da máquina, engordada sobretudo em governos petistas movidos pelo apetite pela coisa pública, a remuneração média subiu 53% acima da inflação, distanciando-se em 96% dos salários médios para as mesmas atividades no setor privado. Em termos de vencimentos, a média dos servidores federais era de R$ 11.842 em 2019, ante R$ 1.960 na área privada.
Ao longo dos últimos 15 anos, identificou o jornal, não só mantiveram-se carreiras que já desapareceram, como datilógrafos e operadores de videocassete, como criaram-se novas. Hoje, o emaranhado estatal exige a administração de 440 diferentes rubricas. Só a sua gestão imobiliza 15,5 mil funcionários e custa R$ 1,6 bilhão por ano. Em mais uma excentricidade brasileira, o funcionário que presta concurso para um órgão não pode ser transferido, mesmo que haja sobra de pessoal em um deles e escassez nos demais. Tal complexidade e dimensão não são só um pesadelo administrativo. Ao se reduzirem as possibilidades de crescimento e realização profissionais, desmotivam-se servidores e corrói-se a eficiência do serviço púbico.
Esse cenário é injusto para o Brasil e para os próprios funcionários, que deixam de aproveitar oportunidades oferecidas pelo moderno mundo do trabalho. Há, sem dúvida, ilhas de excelência na atividade pública, mas em geral elas se devem mais a qualidades individuais do que a um modelo que atenda às exigências contemporâneas de mobilidade entre carreiras, com atuação ágil e flexível como resposta às novas demandas dos contribuintes.
Por tudo isso, a reforma em gestação deve ser apenas um verniz futuro sobre uma estrutura que já não consegue, por custo e eficiência, dar conta do recado de um país continental e de um mundo em acelerada mutação. A evidente capacidade de pressão de corporações para conservar tudo como está e o baixo empenho do presidente Bolsonaro em mexer em um vespeiro político não autorizam otimismo com a mudança significativa desse quadro. Mas o fato de o tema vir agora à tona ao menos estimula o debate sobre o modelo de administração pública que o Brasil um dia precisaria enfrentar