Por Thiago Botter Maio Rocha, psiquiatra da Infância e Adolescência, Hospital de Clínicas de Porto Alegre e Hospital Moinhos de Vento
Em uma conversa informal com uma colega pediatra, experiente em casos graves, um desabafo: "Não sei bem o que está acontecendo, mas não era tão comum vermos tantos casos". Ela se referia a quadros de depressão em adolescentes. Constatações como essa têm sido comuns, preocupando pais, professores e profissionais da saúde.
Os quadros depressivos, quando surgem cedo na vida, podem ter impacto mais grave, prejudicando relacionamentos, desempenho na escola e no trabalho. Além disso, estão associados ao abuso de drogas e ao suicídio – segunda principal causa de morte evitável entre jovens.
Mas e se fosse possível prever qual a chance de um adolescente ter depressão no futuro? Isso poderia nos ajudar a entender por que alguns jovens desenvolvem a doença e outros não – e talvez a avançar na possibilidade de prevenção desses quadros.
Foi com esse propósito que nosso grupo, em parceria com pesquisadores da Inglaterra e Nova Zelândia, deu um passo pioneiro nessa direção, em um artigo recentemente publicado na mais importante revista do mundo sobre psiquiatria da infância e adolescência. Inspirados em estratégias já utilizadas em outras áreas da medicina, quando fatores como hipertensão, diabetes ou tabagismo são utilizados para medir o risco de infarto ou derrame, propusemos uma maneira de calcular o risco de um adolescente desenvolver depressão mesmo antes do aparecimento dos sintomas.
Fazendo uso de informações simples, como características pessoais e situações vivenciadas ao longo da vida de cada adolescente, sem necessidade de exames complexos, buscamos desenvolver uma ferramenta para auxiliar clínicos e pesquisadores a identificar aqueles adolescentes com maior risco de desenvolver um quadro depressivo futuro.
Apesar de ser um passo ainda inicial, esperamos avançar mais em breve: a ferramenta, ainda não recomendada para uso clínico, está servindo de base para o projeto Idea, uma rede de colaboração de pesquisadores do Reino Unido, do Brasil, da Nigéria e do Nepal, que tem como meta reduzir o impacto da depressão na adolescência no mundo.