Por Pedro Dutra Fonseca, professor titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS
O governador Leite atribui a desaprovação a seu governo por ser de centro, posição vulnerável a extremos dos dois lados. Tal interpretação, subliminarmente, isenta-o das críticas ao desqualificar os contendores. Mas resgata o debate sobre o significado de ser "centro". Uma tese clássica em Ciência Política postula que os candidatos tendem a convergir para o centro para conquistar o eleitor mediano, às vezes chamado de "maioria silenciosa", já que os radicais são minoritários, embora barulhentos. A maioria das democracias logra isolá-los na hora de governar, daí ser o centro um pilar para a governabilidade. Quando se esvazia, a sociedade divide-se em dois lados sem mediação. O desfecho tende à tragédia. Caso típico foi a Espanha na década de 1930, dividida entra fascismo e comunismo: a solução encontrada foi a guerra civil. As guerras favorecem divisões polares irreconciliáveis, quando há inimigos e não adversários. A ascensão dos bolcheviques na Rússia e do nazifascismo dificilmente se explica sem o contexto beligerante e coexistiu, por motivos diferentes, com o esvaziamento do centro na política.
As democracias precisam do centro para assegurar a governabilidade
O que é ser de centro varia historicamente, mas, ao contrário do que se pensa, não significa fraqueza, indefinição ou "em cima do muro". Bons políticos com tal perfil são posicionados – o que os diferencia é a habilidade para negociar e transigir. Exemplo ilustre foi Tancredo Neves, que defendeu a posse de Goulart em 1961 e as eleições diretas em 1984; vencido, soube construir soluções negociadas e com respeito à institucionalidade e à democracia. Mas tal jeito – dito "mineiro" – de fazer política é cada vez mais raro.
O peculiar no século 21 é o ressurgimento da bipolaridade mesmo na ausência de guerras. A era da globalização expressou a vitória do liberalismo, que agora não sabe o que fazer com os deserdados. O totalitarismo e o populismo do século 20 aproveitaram-se da era do rádio; os atuais, das redes "sociais". Estas potencializam o impactante: o pensamento mediano não atrai seguidores, o ponderado passa por covarde e, na imensidão de informações, o exótico e o raso emocional atraem muito mais cliques. Só não mudaram a xenofobia, os preconceitos e o radicalismo, cujas explicações prontas e simplistas desafiam a razão e o centro na construção de alternativas.