Os proprietários de veículos e os órgãos estaduais responsáveis pela arrecadação do Dpvat estão na linha de tiro entre o Planalto e o Supremo Tribunal Federal (STF) na questão que envolve o pagamento do seguro destinado a indenizar danos pessoais causados por acidentes de trânsito. A querela é reveladora dos maus hábitos administrativos brasileiros. O Dpvat era para ser um instrumento que garantisse a reparação a vítimas, mas, com o tempo, transformou-se em um campo fértil para fraudes. Uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) detectou que, apenas de 2005 a 2015, foram R$ 2,1 bilhões desviados por meio de indenizações indevidas e gastos administrativos irregulares. A presidente da Superintendência de Seguros Privados (Susep), Solange Vieira, recentemente classificou o Dpvat como ineficiente. Um estudo do governo detectou, por exemplo, que a maior parte das indenizações vai para o próprio motorista, mesmo que tenha sido o causador do acidente, ou é gasto em custeio e tributos indiretos. Se algo é ineficaz e presta-se a malfeitos, precisa ser alvo de intervenção.
O governo Jair Bolsonaro agiu de forma acertada ao tentar mudar esse cenário esdrúxulo, mas cometeu uma barbeiragem ao fazê-lo, mais uma vez, via medida provisória (MP). Como resultado, esbarrou no fato de a MP ter sido derrubada pela maioria do plenário do STF, no dia 19 de dezembro, por seis votos a três. O entendimento foi de que, para tratar do tema, o governo deveria ter enviado um projeto de lei para o Congresso. Ato contínuo, no último dia 27, uma resolução do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) reduziu substancialmente o valor da taxa. Mas, na virada do ano, o presidente do STF, Dias Toffoli, de plantão, anulou também a iniciativa do órgão, alegando que ela esvaziava a decisão anterior da Corte.
Nessas idas e vindas, o contribuinte é a vítima. No caso do Rio Grande do Sul, só descobriu ontem quanto e quando deverá pagar. Mais do que isso, fica a permanente suspeita de que a taxa alimenta uma cadeia de beneficiários não unicamente interessados em proteger as vítimas de trânsito. O assunto agora tem de esperar uma solução definitiva do plenário do STF, mas não há data prevista para a sessão, prolongando o imbróglio.
O fato é que toda essa pendenga revela o excesso de normas, taxas e cobranças que se faz sobre o pobre contribuinte brasileiro. Melhor seria se o Executivo enviasse ao Congresso um projeto de lei simplificando de uma vez o pagamento do seguro obrigatório. Com a discussão no Congresso, será possível também esmiuçar melhor os interesses envolvidos nessa disputa e se definir quanto, de fato, cada dono de veículo deve pagar para assegurar a proteção a terceiros.