Superada a fase inicial de estranhamento, fruto de declarações despropositadas do presidente Jair Bolsonaro ainda na época da campanha, parece que o pragmatismo voltou a prevalecer e brasileiros e chineses caminham para estreitar laços. Na passagem da missão comercial e diplomática pelo gigante asiático, principal destino do périplo pela Ásia, ficou a mensagem de que o país está aberto a fazer negócios que interessem às duas nações.
Se, no ano passado, o então candidato causou mal-estar ao sentenciar que a China estaria mais propensa a comprar o Brasil do que a comprar do Brasil, o discurso preponderante agora por parte do Planalto é de que o interesse maior está no intercâmbio com as principais economias do mundo, sem importar o viés ideológico. No gesto, acerta Bolsonaro, que viajou a convite do presidente Xi Jinping, no momento em que são comemorados os 45 anos do aniversário do estabelecimento de relações entre os dois povos.
O discurso preponderante agora é de que o interesse maior está no intercâmbio com as principais economias do mundo, sem importar o viés ideológico
Os números mostram, de forma nítida, a relevância da China. É o principal parceiro comercial do país, com trocas que, apenas neste ano, de janeiro a setembro, alcançaram US$ 72 bilhões. No caso do Rio Grande do Sul, a corrente de comércio foi de US$ 4,5 bilhões no mesmo período, com as exportações gaúchas centradas principalmente em soja, celulose e carnes. Motivos mais do que suficientes para nutrir um bom convívio com os chineses, que também, nos últimos anos, empreenderam pesados investimentos em território nacional, em áreas como logística e energia. Para o Brasil, o grande interesse imediato é se consolidar como um fornecedor relevante e estável de alimentos, mas também há espaço para imprimir maior cooperação bilateral em outras áreas, como tecnologia, um tema sempre sensível e estratégico.
Os sinais iniciais de tensão no começo do ano, com a chegada de Bolsonaro ao poder, começaram a ser superados com a viagem do vice-
presidente Hamilton Mourão, em maio, à China. Foi também um prenúncio de que o Brasil não tomaria publicamente parte no conflito entre Estados Unidos e China. Mesmo que Bolsonaro seja um fã declarado
de Donald Trump, demonstrar adesão às teses da Casa Branca seria imprudência desmesurada. Afinal, mais cedo ou mais tarde as duas maiores potências do mundo vão voltar a apertar as mãos. E, no mercado mundial de produtos agrícolas, que tem os chineses como principal destino consumidor, são os norte-americanos os grandes concorrentes dos brasileiros.
Na política de relações exteriores do Brasil, o melhor é que a racionalidade, sempre, se imponha. A mesma lógica deve prevalecer na convivência com os vizinhos do Mercosul. A ameaça do Planalto de tirar o país do bloco não pode passar de mais uma bravata.