O Brasil terá amanhã, na abertura da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, uma oportunidade de recuperar, pelo menos em parte, os abalos à sua imagem perante os olhos da comunidade internacional. O desgaste dos últimos dias, gerado pela percepção de que o país descuida da Amazônia, é nocivo não apenas ao presidente Jair Bolsonaro, mas a todos os brasileiros, pelas suas consequências políticas e econômicas.
O presidente já avisou que adotará um tom conciliador, o que, por si só, alimenta as esperanças de um discurso que construa pontes em vez de derrubá-las.
Grande parte do prejuízo foi potencializado pela trôpega reação inicial do governo às notícias sobre queimadas na região. Em vez de planejar uma reação objetiva e racional, o presidente Bolsonaro embarcou em mais um delírio paranoico, gerando atritos, por exemplo, com a França e com outros países tradicionalmente amigos e parceiros comerciais.
Há 64 anos, os presidentes brasileiros abrem a Assembleia Geral da ONU. A tradição é uma homenagem ao Brasil, primeiro país a aderir à instituição, e ao gaúcho Oswaldo Aranha, que presidiu a primeira sessão especial desse fórum. Amanhã, quando se pronunciar diante de mais de uma centena de líderes mundiais, Bolsonaro terá a missão de falar em nome não apenas dos grupos que representa, mas de um país plural e democrático. O presidente já avisou que adotará um tom conciliador, o que, por si só, alimenta as esperanças de um discurso que construa pontes em vez de derrubá-las. Um dos pontos anunciados, por exemplo, é a defesa da soberania sobre a Amazônia, que merece apoio de todos os brasileiros. Mas o aplauso da comunidade internacional só virá se as palavras forem acompanhadas de medidas concretas para garantir a integridade _ compatível com o uso sustentável _ da maior floresta tropical do mundo, que importa diretamente não apenas ao Brasil, mas a todos os seres vivos do planeta.
É fato que existem queimadas todos os anos e que elas não ocorrem apenas por aqui. Mas a resposta a essa realidade não é apontar dedos aleatoriamente na direção dos adversários políticos de plantão, mas sim adotar medidas de forma rápida e efetiva para minimizar o problema, o que o governo só fez tardia e parcialmente, deixando, com isso, que se alastrasse a percepção de paralisia e descaso com a Amazônia, uma causa simpática e facilmente defensável diante da opinião pública mundial.
Se o prenúncio de um tom racional no discurso de Bolsonaro na ONU é um alívio antecipado, por outro lado gera preocupação a notícia de que estará na comitiva brasileira em Nova York a representante dos povos indígenas autora de um vídeo banalizando os incêndios na Amazônia e afirmando que as notícias sobre o fato têm o único objetivo de prejudicar o governo. Não se trata aqui de condenar qualquer tipo de manifestação, o que é garantia constitucional de todos os brasileiros, mas sim de defender os verdadeiros interesses do país em um espaço de grande visibilidade e relevância. A Assembleia da ONU é a oportunidade ímpar para buscar, na inspiração de Oswaldo Aranha, o pleno exercício do poder em nome do bem comum, também conhecido como política. É fundamental para o Brasil não desperdiçar essa chance.