Por Pedro Dutra Fonseca, professor titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS
Vence nos próximos dias a tarefa delegada ao presidente do BNDES de abrir a "caixa-preta" do banco. Há enorme expectativa, pois este possui cerca de R$ 110 bilhões em ações de empresas e chegou a emprestar mais de R$ 150 bilhões por ano. Eventuais falhas não diminuem sua importância para a retomada do crescimento. É instituição de porte sem similar ao sul do Equador e invejada mundo afora. Joaquim Levy, seu antecessor, apesar de louvado pelo mercado, foi destituído do cargo pelo jornal. Afirmou que não encontrara caixa-preta alguma. Pode ter razão, pois o banco é objeto de auditorias e controles, e conta com setor jurídico experiente para resguardar contratos e decisões.
Em todo caso, a tarefa tem mérito em si: nada exige mais transparência do que o uso e o destino do dinheiro público. E, além da questão legal, há a ética. Francamente: o BNDES não foi criado para financiar jatinhos a executivos nervosos com aviões de linha. Se erros forem constatados, é preciso reforçar os controles e ir além da exploração política (esta é inevitável), para que não se restrinja a mero episódio. O mal das devassas é que, na maioria das vezes, esgotam-se em si mesmas: desvendam o passado, mas não impedem a repetição dos desvios no futuro. Assim, tornam-se inócuas na prática e são desmoralizadas como revanchismo político.
Indo além, sabe-se que a alocação privada de recursos públicos não é peculiaridade do BNDES. Como moralismo pela metade é imoralidade, o ministro Guedes teria que olhar para sua própria casa e abrir a "caixa-preta" do Ministério da Economia. Diante de cortes drásticos em educação, ciência e tecnologia, saúde e defesa, como manter desonerações, renúncias fiscais e subsídios concedidos nos últimos anos (as famosas "bolsas-empresário"), que só em 2017 teriam chegado a de R$ 400 bilhões, conforme dados do próprio governo? Como se vê, hospitais, universidades, caserna e cientistas pagam a conta, pois para outros fecham-se os olhos.
É preciso ter consciência de que financiamentos e subsídios não são atos ilegais nem heresias econômicas. Embora usuais no mundo inteiro, aqui, por serem envoltos em mistério, lembram falcatruas. Aconselhável para se chegar à paz da bandeira branca seria tratá-los com máxima publicidade. Enquanto forem sigilosos, a suspeição é inevitável.