Por Jorge Barcellos, doutor em Educação pela UFRGS
A imagem que vejo é a do chão batido vista pelas frestas de um piso de madeira. A casa é um barraco simples, um quarto alugado. É a imagem mais antiga que tenho de minha infância: eu vivia ali. Minhas origens estão na pobreza.
Tudo o que consegui foi graças ao ensino público, da educação básica à pós-graduação. Aprendi o que sei com grandes professores como Sandra Pesavento, Gerd Bornheim e muitos outros. Sobrevivi graças a Universidade, formação essencial para devolver à sociedade pelo trabalho o que ela investiu em mim.
O governo federal anunciou a entrada do capital privado no financiamento da universidade pública, através de vários processos, que incluem a venda de espaço comercial. Só este ponto já é problemático: colocar marcas ressignifica a universidade. Quem impedirá que uma indústria de armas anuncie no prédio do curso de biologia?
"Future-se" é o nome do programa do governo, forma simbólica de dizer que, no horizonte neoliberal, não há alternativa senão a responsabilização individual combinada com a desresponsabilização do Estado. O projeto inicia o fim do acesso dos pobres à pós-graduação, com direito à fundo soberano negociado na bolsa, privado, multimercado, onde projetos concorrem por recursos. Não é a melhor forma de exterminar as Ciências Humanas? Quem irá pagar pela pesquisa em filosofia ou em pesquisa básica? Em outros países, esse tipo de reforma leva anos. Aqui, o governo tem pressa.
É o velho jogo do capitalismo, dos monopólios e finanças. É a ideia de 'linha de montagem" que me assusta: aos poucos, como nos EUA, as grandes corporações da educação irão tomar conta da universidade como se o conhecimento fosse equivalente a refrigerante. O capital ama o monopólio e odeia concorrência, principalmente do Estado. Livre concorrência? Come on!
O governo vai tirar nosso futuro com a reforma da previdência e acabar com as reservas nomeando capitalistas para administrar áreas de preservação. Mas ele não pode transformar a universidade em mercadoria. Isso merece uma resposta à altura: às ruas, estudantes!