Por Pedro Dutra Fonseca, professor titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS
A repercussão sobre a proposta de uma moeda única para o Mercosul ofuscou outra ideia, também na área do câmbio, cogitada pelo presidente do Banco Central: a liberalização da venda, compra, posse e abertura de contas bancárias em moeda estrangeira. O sistema de plena conversibilidade é adotado por vários países, embora a maioria exerça controle, maior ou menor, no câmbio. Aqui, pelo menos desde o fim do Império, a regra tem sido a adoção dos mais diferentes mecanismos de intervenção, não raro com monopólio de operação no Banco do Brasil. Após a Segunda Guerra, chegou-se a quase uma dezena de preços para o dólar, o qual variava conforme o bem a ser importado ou exportado. A nova regra permitirá, para o público, a saída dos dólares de baixo do colchão para depósito em lugar seguro, além da agilidade para remessas e pagamentos ao Exterior. O Banco Central também seria aliviado de bancar os custos de parte das reservas. Mas quem mais pressiona pela mudança são os investidores externos e exportadores, que se queixam da rigidez e demora nas transações. Daí a argumentar que as novas regras atrairão capitais para o país é um passo.
Mas, como tudo na vida, há o outro lado. O Banco Central perderá graus de liberdade para enfrentar crises cambiais. No momento, o país tem U$ 375 bilhões de reservas, o que lhe dá retaguarda. Mas sempre será assim? A economia brasileira não se dolarizou nos períodos de alta inflação, ao contrário dos vizinhos latino-americanos, porque tinha títulos indexados, inclusive em dólar, e um mercado regulado, o que representou grande diferença para arbitrar ganhos e perdas. Se o mundo fosse sempre de bonança e equilíbrio, como nos manuais introdutórios de economia, nada haveria a temer. Todavia, a vulnerabilidade externa é mais regra do que exceção para os países que não emitem moeda forte – nem a China se considera apta para a plena conversibilidade. É dever precípuo do Banco Central garantir a estabilidade da moeda, por isso, mudanças institucionais de tal envergadura devem ser muito bem pensadas e planejadas. O fato de seus dirigentes admitirem que elas serão graduais e sujeitas a avaliação é um alento. Improviso e jogo para a plateia é o que menos se espera, restando indagar: se vamos bem na área cambial, por que mexer no que está dando certo?