Por Pedro Dutra Fonseca, professor titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS
A interferência presidencial nos preços da Petrobras trouxe uma consequência inesperada: teme-se que se repita no Banco Central, o que fortaleceu os defensores de sua autonomia, cujo projeto iniciou a tramitação na semana passada. Esta prometia ser morna e mais simbólica, pois, mesmo que a lei trate os dirigentes do Bacen como cargos de confiança, demissíveis a qualquer momento, desde FHC há autonomia instrumental, assegurada desde que metas sejam cumpridas, como as de inflação. A crise que levou ao impeachment de Dilma começou com seu rompimento com tal acordo, em agosto de 2011. O banco foi criado em 1964 por Castelo Branco com maior autonomia, mas Costa e Silva a reverteu em 1967. Autonomia, em resumo, significa duas prerrogativas: (a) mandatos fixos aos dirigentes; e (b) atribuição a eles para definir as metas e os instrumentos das políticas monetárias e cambiais. Tal poder não é pouco – define o rumo da política econômica – e, por isso, seus críticos se perguntam de que vale eleger governantes se o Bacen tem carta branca para agir independentemente dos processos eleitorais. Já os defensores visam justamente resguardá-lo das injunções políticas.
Todavia, a rigor, independência absoluta não existe, e se pode falar em “graus de autonomia”. Como os dirigentes do Bacen não caem do céu, é preciso saber quem os indicará (o governo? O Congresso? Os próprios funcionários, por lista tríplice, como no MPF? Representantes dos banqueiros? Dos bancários?) e qual o perfil e a qualificação mínima exigida para os cargos. Hoje, é o presidente da República com aprovação do Senado, mas esta última não passa de mera formalidade. Seria o caso de alterar esse critério? Trata-se também de aproveitar a oportunidade para estabelecer se profissionais oriundos do setor financeiro podem ser indicados, sem prejuízo dos concorrentes, e se deve haver um período de “quarentena” para voltar ao setor depois de ter acesso a tantas informações privilegiadas - regra no mundo civilizado.
Em síntese, tem-se de evitar o debate polarizado e emocional de simples sim ou não à autonomia, como se se tratasse de um plebiscito. É nos detalhes que mora a diferença e há vários tons de cinza entre o branco e preto. Infelizmente, o ambiente do país não colabora para tal prática.