Por Pedro Dutra Fonseca, professor titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS
O próximo ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, terá trabalho para reverter os rumores do último mês. A área nunca foi tema de destaque nas eleições brasileiras. Neste ano, não foi diferente, com a peculiaridade de um segundo turno sem debates e programas detalhados, com candidatos indispostos a abordar temas polêmicos.
Por isso, causam apreensão as notícias de mudanças bruscas na política externa. Nada confirmado, mas as conjecturas preocupam: a troca de embaixada de Israel para Jerusalém, a retirada de apoio ao Mercosul, ao Acordo de Paris e às relações com a China. De uma tacada, atingem-se dois terços das exportações brasileiras. Trata-se de 22 países árabes e 28 europeus, os quais importam itens de mercados sensíveis, marcados por barreiras sanitárias, como carne e frango, itens estes exportados também para a China – para onde ainda se destacam soja, açúcar, celulose e café. É certo que o Brasil tem sido extremamente receptivo aos chineses sem exigir contrapartidas: tenho sido crítico a atender exigências sem reciprocidade de tratamento. Mas não se pode esquecer que é nosso maior importador e, tampouco, o superávit de US$ 20 bilhões na balança comercial em 2017 (enquanto com os EUA houve déficit de US$ 2 bilhões). Já o Mercosul é dos poucos mercados em que o Brasil avançou nos manufaturados e a relação deve ser avaliada além da cifra do saldo comercial, mas como geopolítica continental, sem contar os quilômetros de fronteiras entre os países. Para o setor calçadista, justamente agora que se livrou das barreiras de Cristina Kirchner, seria lamentável que o conflito começasse pelo lado de cá. E como ficaria o agronegócio sem a China?
A justificativa para tais mudanças seria romper com a ideologização da política externa dos governos petistas, da qual se quer diferenciar. Mas tal caminho está equivocado. A polaridade não deveria ser substituir uma ideologização “de esquerda” por outra também ideológica, mas por política externa mais pragmática, voltada a consolidar relações e buscar novas frentes de exportação. Ou se está propondo a mesma coisa com sinal trocado? Nesta conjuntura em que os EUA se voltam para dentro, apostar em quem não está disposto a mais comércio e litigar contra tradicionais parceiros não é alternativa razoável.