Por Gabriela Ferreira, líder de Impacto Social do Tecnopuc e diretora técnica da Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec)
Quando a gastronomia molecular surgiu, na segunda metade da década de 90, pela mão de dois pesquisadores, e não de chefs de cozinha, pensamos que a cozinha nunca mais seria a mesma. A ordem era desconstruir e reconstruir, redefinindo o que era comida. O objetivo era entender os processos físico-químicos que ocorriam no ato de cozinhar e como isso podia ser melhorado. Ou seja, trazer ciência para a mesa de jantar. Porém, no imaginário de algumas pessoas, isso significava: esqueça o sabor do feijão recém feito da sua vó ou aquele aroma do seu doce preferido no Natal.
O futuro passou a ser visto como uma complexidade de texturas, cores e sabores nunca antes imaginados, não encontrados na natureza nem na mesa do dia a dia. Ou será que passaríamos a viver de “comida de astronauta”? Essa era outra opção possível: produtos liofilizados, sem cor e sem vida. E foi então que, em 2015, a Nasa cultivou o primeiro pé de alface em uma estação espacial. Opa! Seremos pessoas normais, e vegetarianas, quando formos para Marte?
A inovação tem muito a fazer pela produção de alimentos, seja ela tecnológica ou não. Precisamos desenvolver formas sustentáveis de produzir mantimentos para uma população mundial que ultrapassará 8 bilhões de pessoas em 2030. Urge que o sistema econômico global dê conta do desafio que é ter metade da população atual vivendo abaixo da linha da pobreza e sem acesso à nutrição adequada. É imperativo diminuir a marca de 30% dos alimentos desperdiçados no mundo. E é nesse cenário que surgem, entre outras tendências, o confort food, a valorização do insumo regional, as certificações de origem e a disseminação de empresas de pratos “caseiros”. A inteligência artificial vai mudar a forma como estruturamos a produção e acessamos os alimentos. O desenvolvimento de produtos e seus insumos certamente será condicionado por big data. Talvez até nosso caderno de receitas seja escrito em blockchain. Mas a comida parece que vai continuar, cada vez mais, com jeito de casa. Cheirando às memórias da infância e com texturas verdadeiras. Assim mesmo, como fazia a sua vó.