A revelação feita pelo jornal The New York Times de que a direção do Facebook omitiu informações sobre a interferência russa e a disseminação de notícias falsas durante as eleições americanas apontou também que a empresa de Mark Zuckerberg cometeu um erro ainda mais grave: ignorou, deliberadamente, alertas para corrigir o problema.
A extensa investigação, realizada ao longo de seis meses e com base no depoimento de mais de 50 pessoas, mostra que, preocupada com os próprios ganhos, a única providência que a companhia tomou diante da evidência da intromissão de hackers foi contratar uma firma de relações públicas para atacar concorrentes e detratores.
Se a empresa adota essa postura nos Estados Unidos, imagine-se em outros países. No momento, a plataforma é acusada de favorecer discursos de violência e perseguições em Mianmar, na Tailândia, na Índia e em muitos outros países onde cresce a manifestação de preconceito e intolerância a minorias étnicas.
No Brasil, onde se formaram alianças de meios de comunicação profissional, com apoio das gigantes de tecnologia, houve avanços na tentativa de conter o fluxo de desinformações nas redes. Mas trata-se ainda de uma gota em um oceano de notícias falsas.
Os propagadores de mentiras se valeram da difusão de informações enganosas nas redes ainda pouco passíveis de monitoramento. Foi justamente assim que o WhatsApp, pertencente ao Facebook, fez no Brasil sua estreia na difusão de inverdades em larga escala, beneficiando e prejudicando os principais candidatos na corrida presidencial e gerando confusões no processo de escolha.
Sem dúvida, o principal agente a ser punido pela disseminação de notícias falsas é quem as cria para prejudicar os outros, mas as redes sociais – como o Facebook – não podem se eximir da responsabilidade que assumem ao se transformarem em distribuidores de conteúdo. Devem, sobretudo, ser tratadas como veículos de difusão e responder por isso. Como se vê com mais nitidez nos Estados Unidos, essa desfaçatez perdura quando a empresa é chamada a colaborar com as autoridades na busca da correção da falha.
Mais do que a efetiva vontade de impedir interferências externas, é preciso ampliar a transparência de seus métodos de distribuição e de atingimento do público nas redes. Somam-se aos incontáveis casos de fraudes e ao uso de robôs para inflar métricas de audiência os vexames de marcas conhecidas serem associadas automaticamente a páginas que difundem racismo, xenofobia e perseguições a minorias, quando não até estímulo ao terrorismo. Não à toa, uma série de anunciantes optou por se afastar do Facebook após a revelação de mais esse escândalo.
O episódio é uma oportunidade para a empresa de Mark Zuckerberg não apenas fazer um mea-culpa mas de fato assumir suas responsabilidades globais na manutenção da democracia e trabalhar com seriedade para sanar seus problemas.