Com o mapa político do Brasil que sai das urnas, fica evidente o desejo do eleitorado de romper com o modelo que vigora desde a redemocratização. Ao optarem por uma clara guinada à direita, os eleitores mandaram para casa velhas lideranças e sepultaram um ciclo da política que previa o revezamento entre PT e PSDB, dois partidos associados à política tradicional. Houve também surpreendente renovação nos parlamentos, ao contrário do que se previa a partir de uma reforma no financiamento de campanha com potencial para favorecer mais quem já tem mandato. Caciques eleitorais, sobretudo no Norte e Nordeste, alguns deles envolvidos com denúncias de corrupção, acabaram ficando fora da cena política.
O grande vencedor do primeiro turno é sem dúvida Jair Bolsonaro, que alavancou votos para correligionários em escala raramente vista em democracias mundo afora. Caso venha a ser confirmado em 28 de outubro, é muito provável que o candidato do PSL passe a contar com uma maioria no Congresso que permita endereçar suas promessas. A campanha do presidenciável com maior percentual de votos enterrou também a velha prática de evitar abordar em público temas delicados ou supostamente impopulares, como as privatizações. A reação das urnas mostrou que candidatos de centro, mesmo com discurso conciliador e economicamente responsável, tiveram desempenho pífio, justamente em consequência de uma onda antissistema de proporções inéditas.
À exceção do Nordeste e de uma parte do Norte, as urnas também deram uma resposta dura à campanha para a libertação de Lula e às teses mais caras ao PT. Entre muitos equívocos, o partido confiou apenas na idolatria ao ex-presidente, preso em Curitiba, e na crença de que seria capaz de voltar ao passado, para reconquistar o apoio do eleitorado. É sintomático que também nomes da linha de frente da defesa de Lula, entre os quais o mais significativo foi o de Dilma Rousseff, tenham sido desprezados pelas urnas tanto quanto alguns aliados de Michel Temer.
O resultado da eleição na primeira etapa deixa um alerta importante para políticos tradicionais e para formas de atuação as quais os eleitores, majoritariamente, manifestaram pelo voto a intenção de não aceitar mais. O segundo turno haverá de dizer se o tsunami Bolsonaro foi uma onda passageira ou veio, com tudo o que ele significa, para se consolidar como uma nova e poderosa força política no Brasil.