Por Cris Netto, escritora
Estamos na primavera. Os caminhos estão mais floridos, as roupas mais leves, o despertar mais tranquilo, o vento gelado do inverno abre passagem para as brisas suaves das manhãs e dos fins de tarde. Quando o despertador toca, o dia já está amanhecendo. Os sons da noite são substituídos pelo canto dos pássaros, que, muitas vezes substituem o próprio alarme do despertador. A função soneca deixa de ser acionada, porque o sol já penetra na cortina ainda cerrada do quarto. O corpo começa a entender que está na hora de levantar. E antes que chegue o verão, com a força e o calor do sol, teremos um prenúncio de suas bênçãos com dias mais longos, alegres e coloridos. Um pequeno ajuste nos ponteiros do relógio e a mágica está feita.
Um curto período em que ganhamos aquilo que sempre pedimos: tempo. O dia de trabalho inicia e me sinto como uma criança que olha para uma caixa de brinquedo na prateleira mais alta da loja. De dentro do escritório vejo o dia passar. As janelas são lacradas. Ganhamos em modernidade nos escritórios, mas perdemos em essência. Graças a essa brecha aberta no calendário e à mágica feita pelos ponteiros do relógio, ao final do dia é possível sair da caixa de vidro e ainda aproveitar o sol. Durante os quase quatro meses em que dura o horário de verão, alcanço o brinquedo no alto da prateleira.
Há muitas divergências sobre horário de verão. Tem aqueles que odeiam e que culpam o relógio biológico pelo mau humor que os acompanha desde o amanhecer, como também há aqueles que, como eu, acreditam que ganhamos de presente uma hora a mais no dia. A polêmica cresceu nesses últimos anos, quando especialistas começaram a questionar os reais benefícios econômicos do horário de verão. No entanto, minha percepção e sentimento em relação ao período são muito mais filosóficos. Para mim, não se trata nem de economia de energia, nem de uma hora a menos de sono.
Quanto tempo realmente é uma hora? Sessenta minutos? Não, é muito mais do que isso. É mais tempo na pracinha com as crianças, é mais tempo no happy hour com os amigos, é mais tempo no futebol com a turma. As rodas de chimarrão ao redor da piscina se prolongam porque o jantar também é servido sem pressa. É chegar em casa com a sensação de que se viveu, e não apenas passamos por mais um dia. Quando esses momentos são bem vividos, uma hora ganha uma proporção muito maior do que 60 minutos. É mais tempo, mais sol, mais vida.
Alguém já disse que a vida é muito curta para se esperar pelo verão, pelas férias, pela sexta-feira. Então por que não aproveitar e amar cada minuto ganho com a chegada do horário de verão? De uma forma ou de outra a noite chegará e Morfeu nos acolherá em seus braços. Nosso corpo descansará e nossa alma agradecerá pelos momentos vividos. Que a mágica dos ponteiros do relógio seja feita, sempre e cada vez mais. E, por que não, que com o passar dos anos, possamos aprender a viver os benefícios do horário de verão em todas as estações do ano.