Por Cezar Roedel, professor de Relações Internacionais
Avaliar se o encontro dos líderes norte-coreano e americano foi um fracasso ou um sucesso, dependerá, em muito, da histórica duplicidade norte-coreana. Por diversificadas vezes a Coreia do Norte já fez concessões, grande parte por decisões resolutivas do Conselho de Segurança da ONU. Todavia, inúmeros foram os momentos, após certa acomodação, em que o regime veio a testar novamente as armas nucleares. As idas e vindas do ditador e de seu programa nuclear imprimiram uma nostalgia na política internacional: momentos de recuo mediante sanções ou momentos de ameaça inflamada por uma retórica cinematográfica.
Todo o aceno diplomático pode ser vantajoso caso arraste benefícios concretos aos seus acordantes. Existem acenos simbólicos, como o caso de Cuba e o reatamento das relações, ainda no governo Obama. Por outro lado, existem aproximações diplomáticas que envolvem maior cálculo político e estratégico, como a possibilidade de demover o programa nuclear de Kim Jong-un. Ambos exemplos são indicadores bem distintos de duas visões antagônicas da política externa americana.
A questão que devemos levantar, do ponto de vista pragmático, é que o programa nuclear norte-coreano tem sido a pedra de toque de uma narrativa para o próprio regime de Kim, o que de certa forma concede uma unidade ao seu comando. Afinal, sua barganha reside no fato de ser um líder não tão previsível e com posse de armamento nuclear. Se de fato, o caminho será o desarmamento, como pondera o documento assinado entre Trump e Kim, estariam o regime norte-coreano e sua narrativa ameaçados? Por qual motivo o ditador ganharia racionalmente com esta decisão? Talvez o delírio narcísico tenha se manifestado com maior veemência no momento.
Só o tempo dirá sobre a sanidade de Kim. Mas a encruzilhada parece ser fatal: ou desmantelará seu programa nuclear, tornando sua narrativa vazia e ineficiente para unificar seu regime, ou retrocederá nas suas decisões, descreditando-se como líder capaz de empreender negociações diplomáticas, ficando sob o risco de uma intervenção militar externa, que praticamente liquidaria seu regime ditatorial.