O Supremo Tribunal Federal (STF) tem a prerrogativa e, mais do que isso, o dever de revisar posições pretéritas quando elas perdem o sentido ou surgem legislação, fenômenos e comportamentos novos. A revisão de jurisprudências é uma necessária atualização para que a Justiça acompanhe, mesmo que em seu ritmo, a evolução da sociedade. Não é o caso, porém, do debate acompanhado com apreensão pelo país sobre uma eventual mudança dos critérios para definir a possibilidade de prisão de condenados após a segunda instância.
Se pautar a discussão agora, pouco tempo depois do posicionamento firmado sobre o tema em 2016, o STF estará adotando um evidente casuísmo em favor de uma pessoa, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. É inevitável que uma eventual revisão dessa jurisprudência venha a ser encarada como um apequenamento da mais alta Corte de Justiça do país diante de pressões de todo tipo. Ao mesmo tempo, contribuiria para ampliar o risco de esfriamento das ações em andamento contra a corrupção _ entre elas, as da Lava-Jato.
Até o entendimento atual, de que o cumprimento da pena pode ocorrer após condenação em segunda instância, dificilmente alguém acabava preso por crime de corrupção. Há, decerto, uma controvérsia jurídica sobre o que pretende a Constituição em relação à prisão de condenados em segunda instância ao afirmar no seu artigo 5º que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado". Não por acaso, o próprio STF se mostra historicamente dividido sobre o tema. A questão do momento, porém, não é jurídica: é de preservação da imagem de uma instituição que não pode mudar de opinião ao sabor do cargo e nome de condenados.
Para não se contaminar pelo personalismo e criar a Lei Lula, deveria o STF esperar o desfecho do caso do ex-presidente antes de pautar novamente a discussão. Se o fizer neste momento, às vésperas de uma decisão jurídica sobre o líder petista, tornará evidente que esse não foi um movimento natural. E, pior, que um dos últimos bastiões da defesa da normalidade institucional vergou sob o peso das pressões de forças poderosas.
Cabe, portanto, ao STF aguardar mais um pouco e deixar seguir o curso natural dos fatos e das instâncias legais. No momento apropriado _ e distanciado de um contexto no qual prevalece todo tipo de pressão _, poderá decidir novamente pela revisão ou não da prisão antes de esgotadas todas as instâncias judiciais.