Um dos principais problemas do mundo é que o bom senso não é bem distribuído. E, para complicar, muitos ainda o confundem com a lógica. Nas questões mais polêmicas, a mistura entre bom senso e lógica gera confusões interpretativas perigosas. Exemplo banal: o bom senso nos diz que homens e mulheres na mesma posição devem ter salários iguais. No entanto, a lógica nos diz que, em muitos casos, isso não é sequer viável. Por quê? Ora, porque, para que isso aconteça, alguém precisaria financiar generosamente o bom senso a fundo perdido. Neymar e Marta, por exemplo, executam a mesma função: ambos jogam futebol com a camisa 10 da seleção brasileira. O primeiro ganha muito mais do que a segunda.
Não é uma questão de bom senso, é uma questão de lógica. Neymar atrai mais público, mais patrocinadores, mais audiência e mais interesse da mídia. Com isso vende mais produtos, gera mais atenção de outros segmentos, cria mais desejo pelas marcas que patrocina e se torna ídolo de crianças e jovens. E acaba atraindo ainda mais audiência e interesse, girando a roda novamente. Como o futebol masculino atrai mais público do que o feminino, o ecossistema inteiro gira a favor do Neymar e contra a Marta. E é deste ecossistema que vem o financiamento que propicia que ele ganhe mais.
Não é machismo, é lógica. E é fácil comprovar isto: basta trocar o nome de Neymar por Gisele Bündchen. Percebe? O modelo masculino mais bem pago do mundo ganha um terço do que a Gisele ganha, talvez ainda menos. Aqui tampouco é feminismo ou falta de bom senso: é lógica. O ecossistema inteiro da moda gira ao redor e em favor da Gisele. Por isso ela atrai mais público, interesse, audiência, marcas e cifrões. E existem vários exemplos como estes em vários tipos de indústrias e ecossistemas diferentes. Só que o desequilíbrio financeiro ainda é muito maior a favor dos homens.
E de quem é a culpa? Do mercado, de quem vende e de quem compra e, sinto informar, sua também. Porque o mercado somos nós. Nós, que preferimos ver um jogo do Neymar e não da Marta. Nós, que debatemos o Federer e não a Vênus Williams.
Nós, que damos audiência para concursos como Miss Universo. Nós, que damos mais espaço para o homem de negócios do que para a mulher de negócios. Nós, que esquecemos que consumo também é um ato político e uma visão de mundo. Nós, que alimentamos essa máquina que tem muita lógica e pouco bom senso. E que adoramos confundi-los na hora de argumentar a nosso favor.