A Ucrânia disparou pela primeira vez, na terça-feira (19), mísseis americanos de longo alcance contra a Rússia, que prometeu responder e intensificou a ameaça nuclear.
Um alto funcionário em Kiev confirmou à AFP que o exército ucraniano bombardeou a região fronteiriça russa de Briansk com mísseis ATACMS, de longo alcance, fabricados nos Estados Unidos, depois de a Rússia denunciar o ataque.
O chanceler russo, Serguei Lavrov, afirmou que o ataque abre uma "nova fase na guerra do Ocidente contra a Rússia".
— Reagiremos de acordo — acrescentou Lavrov, em declarações no Rio de Janeiro, onde participou da cúpula do G20.
O governo do presidente Joe Biden autorizou, na semana passada, que a Ucrânia atacasse a Rússia com mísseis americanos de longo alcance, em uma mudança estratégica a poucas semanas da posse de Donald Trump.
O presidente russo, Vladimir Putin, não se referiu diretamente a esta nova situação, mas assinou, na terça-feira, decreto que amplia as possibilidades nas quais seu país poderia recorrer ao uso de armas nucleares.
As hipóteses incluem o uso de armas nucleares contra um país que não as possua, como a Ucrânia, mas que seja apoiado por uma potência nuclear, como os Estados Unidos.
Trata-se de uma medida "necessária para adaptar nossos fundamentos à situação atual", explicou o Kremlin.
Putin advertiu em setembro que os países da Otan estariam "em guerra com a Rússia" se permitissem que a Ucrânia atacasse território russo com mísseis ocidentais de maior alcance.
Segundo o exército russo, "às 03h25 (21h25 de Brasília), o inimigo atacou com seis mísseis balísticos um alvo na região de Briansk", perto da fronteira ucraniana.
A defesa antiaérea russa conseguiu destruir cinco projéteis e danificar um outro, acrescentou.
Lavrov afirmou que não é possível usar esses mísseis "sem a ajuda de especialistas e instrutores dos Estados Unidos", que fornecem "dados de satélite, a programação e o alvo".
Além disso, considerou que o uso de mísseis ATACMS contra o território russo é "um sinal" de que a Ucrânia e o Ocidente "querem uma escalada".
A Ucrânia, confrontada com a invasão russa há quase três anos, pedia há muito tempo a autorização para usar armas ocidentais de longo alcance para atacar bases de onde a Rússia lança seus bombardeios e contrabalançar o avanço das tropas russas no leste.
O presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, disse, em uma mensagem ao Parlamento, que "a Ucrânia pode vencer a Rússia", no marco dos mil dias desde o início da invasão, em fevereiro de 2022.
— É muito difícil, mas temos a força interna para conseguir — garantiu, sob aplausos dos parlamentares.
No entanto, o presidente admitiu que Kiev poderá ter que esperar pela era pós-Putin para "restaurar" sua integridade territorial. Atualmente, Moscou ocupa cerca de 20% do território ucraniano.
É a primeira vez que Zelensky reconhece que seu país teria que aceitar, ao menos por um tempo, perder os territórios ocupados pelo inimigo.
Zelensky também acusou os líderes do G20 reunidos no Brasil de não reagirem ao decreto assinado por Putin, que amplia as condições para o uso de armas nucleares.
— Hoje, os países do G20 se reúnem no Brasil. Eles disseram algo? Nada — lamentou.
No terreno, as forças russas avançam em vários setores, especialmente perto de Kurakhove (leste), onde, na terça-feira, afirmaram ter tomado uma nova localidade.
No nordeste, na região fronteiriça ucraniana de Sumi, um bombardeio noturno russo matou 12 pessoas, incluindo uma criança.
Zelensky publicou um vídeo que mostra equipes de resgate retirando corpos dos escombros.
No plano diplomático, vários países europeus afirmaram estar dispostos a fornecer apoio financeiro e militar a Kiev, caso Washington reduza sua ajuda após a chegada de Trump à Casa Branca, em janeiro.
O chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, pediu aos países do bloco que permitam à Ucrânia utilizar as armas de longo alcance cedidas pelos 27 membros para atacar alvos dentro da Rússia, assim como fez Washington.
O secretário-geral da Otan, Mark Rutte, alertou para não permitir que "Putin consiga o que quer", pois sua vitória deixaria uma Rússia fortalecida nas fronteiras da Europa.
— Estamos dispostos a fornecer o que for necessário à Ucrânia — declarou Rutte, para quem a Rússia representa "uma ameaça direta para todos nós no Ocidente".