O falecido líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, considerado o homem mais poderoso do Líbano, vivia escondido desde a última guerra entre Israel e o movimento islamista em 2006. Mas na sexta-feira (27) o exército israelense o localizou e ele morreu em um bombardeio.
O Hezbollah confirmou neste sábado (28) a morte de seu secretário-geral em um ataque israelense contra o subúrbio sul de Beirute, reduto do movimento.
Nasrallah, morto aos 64 anos, fez poucas aparições públicas desde 2006 e o local de sua residência sempre foi um segredo.
Apesar da clandestinidade, o líder da influente milícia xiita recebia visitantes, incluindo os líderes de grupos palestinos aliados de seu movimento, que publicaram fotos dos encontros.
Os jornalistas e personalidades que o encontraram afirmaram que foram levados pelo Hezbollah, com medidas de segurança reforçadas, para um local difícil de identificar.
Nasrallah discursava com frequência e seus pronunciamentos, transmitidos ao vivo, eram acompanhados com atenção no Líbano, pois era considerado o homem mais poderoso do país. À frente do Hezbollah, ele decidia sobre a guerra ou a paz.
Para os seguidores xiitas, ele era objeto de um grande culto de personalidade, mas sua influência afetava a esfera política e sua morte pode ter consequências para toda a região.
Força política
Nasrallah era o líder do Hezbollah desde 1992, quando sucedeu Abbas Musawi, também morto por Israel.
Ao assumir o comando, ele levou o Hezbollah, o "Partido de Deus", de uma milícia armada ao status de força política, com representação no Parlamento e no governo.
Ao mesmo tempo, desenvolveu o arsenal do movimento que, segundo ele afirmava, tem 100 mil combatentes e dispõe de armas potentes, incluindo mísseis de alta precisão.
O Hezbollah é o único grupo que manteve suas armas ao final da guerra do Líbano (1975-1990), utilizando como argumento a "resistência contra Israel", cujo exército se retirou gradualmente do país até abandonar a região sul em maio de 2000, após 22 anos de ocupação.
Ao longo dos confrontos entre seus homens e o exército israelense, Nasrallah estabeleceu a posição como líder e a consolidou em 1997, após a morte em combate de seu filho mais velho, Hadi.
O conflito de 2006 com Israel, que durou 33 dias, permitiu que exibisse a força do seu movimento, com os seus combatentes enfrentando o Exército israelense. A guerra provocou a morte de 1.200 libaneses, a maioria civis, e de 160 israelenses, a maioria militares.
Ao final da guerra, Nasrallah proclamou uma "vitória divina" e virou um herói no mundo árabe.
Mas no Líbano, ele foi criticado por vários setores quando o movimento foi acusado de envolvimento no assassinato do ex-primeiro-ministro Rafic Hariri em 2005, e depois quando homens armados do Hezbollah assumiram brevemente o controle da capital em maio de 2008.
Família modesta
Nasrallah sempre usava túnicas clericais e um turbante preto, característico dos Sayed, os descendentes do profeta Maomé com os quais se identificava. À frente do Hezbollah, ele conseguiu ter uma influência no Líbano e em toda a região.
Em 2013, ele anunciou que determinou uma intervenção militar na Síria para apoiar o regime de Bashar al-Assad, encurralado na guerra civil que explodiu após a repressão de uma revolta popular em 2011.
Por desfrutar da total confiança dos líderes iranianos, ele formou e apoiou movimentos próximos a Teerã na região.
O Hezbollah é atualmente a "joia da coroa" dos aliados do Irã na região — aí incluídos grupos armados no Iraque, os rebeldes huthis do Iêmen e o movimento islamista palestino Hamas.
Hassan Nasrallah nasceu em 31 de agosto de 1960 em uma família modesta de nove filhos, no antigo "cinturão de miséria" que cercava Beirute. Sua família é originária da cidade de Bazouriyeh, no sul do Líbano.
Ele estudou teologia na cidade sagrada xiita de Najaf, no Iraque, mas teve que deixar o país durante a onda de repressão aos xiitas determinada pelo então presidente iraquiano Saddam Hussein.
No retorno ao Líbano, se uniu ao movimento xiita Amal, mas deixou o grupo durante a invasão israelense do Líbano de 1982 para integrar o núcleo fundador do Hezbollah, criado com o incentivo da Guarda Revolucionária iraniana. Casado e pai de cinco filhos, ele falava farsi de maneira fluente.
Choro e tensão em Beirute
A confirmação da morte do líder do Hezbollah provocou cenas de choro e gritos neste sábado nos bairros de Beirute que abrigam os refugiados xiitas e aumentou a tensão na capital libanesa.
Algumas mulheres choravam e batiam no peito, outras pessoas gritavam "Alá Akbar!" (Alá é Grande). Várias se reuniam em pequenos grupos e olhavam para as telas dos smartphones.
Para as pessoas deslocadas procedentes das áreas xiitas do Líbano, sob controle do Hezbollah, que fugiram dos bombardeios israelenses e se refugiaram em Beirute, o choque era imenso.
— Não consigo descrever o choque que este anúncio provoca (...) Começamos gritar, é o nosso pai, aquele que nos deixava orgulhosos, nossa honra — disse Maha Karit, uma das poucas pessoas que aceitou falar com a AFP.
Na varanda de um hotel que recebe os deslocados, uma mulher gritava com os braços erguidos para o céu. Ao observar as câmeras, um grupo de homens que também está na varanda começou a gritar e atirar garrafas de água nos jornalistas.
O anúncio da morte de Nasrallah exacerbou a raiva e o desespero de milhares de deslocados que buscaram refúgio em Beirute na semana passada, abrigadas em condições precárias, em escolas e, em alguns casos, nas ruas.