Associações e fiéis católicos do movimento LGBTQIA+ celebram a permissão do batismo de pessoas trans como um primeiro passo para a inclusão, mas denunciam que as condições de sua aplicação favorecem decisões arbitrárias em dioceses contrárias a essa abertura.
Em um documento publicado na quarta-feira (8), o Dicastério para a Doutrina da Fé, um dos principais "ministérios" da Santa Sé, afirma que os fiéis transgênero podem ser batizados, desde que isso não provoque "escândalo" ou "confusão".
Escrito em resposta a perguntas de um padre brasileiro e aprovado pelo papa Francisco, o documento também não inclui objeções ao batismo de filhos de casais do mesmo sexo, sejam eles adotados, ou nascidos de barriga de aluguel.
Essas situações já ocorreram em diferentes dioceses do mundo, mas, ao expressá-las em um documento oficial e público, o Vaticano parece insistir na importância de uma Igreja "aberta a todos" promovida pelo pontífice argentino desde sua eleição em 2013.
"É, definitivamente, um passo para uma Igreja mais inclusiva e um lembrete de que os católicos transgênero não são apenas pessoas, mas também católicos. Em muitas paróquias e dioceses, eles foram duramente excluídos", disse à AFP o padre jesuíta americano James Martin, conhecido por seu envolvimento em favor dos fiéis LGBTQIA+.
- Equilíbrio -
A publicação do documento ocorreu dias depois do encerramento da primeira Assembleia Geral do Sínodo sobre o futuro da Igreja, um encontro global de bispos e laicos, cujo texto final deixou de lado a espinhosa questão da bênção dos casais homossexuais, contra a qual o clã conservador se opõe ferozmente.
Alguns bispos denunciam a existência de um grupo de pressão anti-LGBTQIA+ na Igreja Católica, que considera as relações homossexuais um pecado e um ato "intrinsecamente desordenado", segundo o catecismo.
O documento do dicastério explica que os fiéis transexuais podem ser batizados, "se não houver situações, nas quais exista risco de escândalo público, ou de desorientação dos fiéis".
Alguns veem aqui uma formulação suficientemente vaga para ser interpretada de forma diferente pelos sacerdotes, dependendo de sua sensibilidade a estas questões. Na prática, isso pode sacrificar qualquer progresso real, permitindo que as dioceses continuem a atuar de formas distintas.
Embora "isto já funcionasse assim na prática", "o lado positivo é que ali [no documento] o papa diz isso, e isso dará um apoio aos padres que fizerem isso", afirma Jonas Sénat, católico transgênero que dirige um grupo diocesano "queer" em Marselha, na França.
Um especialista observador do Vaticano, falando sob anonimato, acredita que "esse documento obriga as pessoas a se colocarem no campo da abertura, ou no da reafirmação da doutrina".
* AFP