Hans Zollner, o membro mais influente da comissão do Vaticano que luta contra abusos sexuais de menores dentro da Igreja, se demitiu nesta quarta-feira (29), reacendendo o debate sobre a efetividade desta polêmica instância, criada em 2014.
"A [Pontifícia] Comissão [para a Proteção de Menores] soube que o padre Hans Zollner pediu para ser dispensado de suas funções", anunciou nesta quarta-feira o presidente da comissão, o cardeal americano Sean O'Malley.
A renúncia, justificada oficialmente pela recente nomeação de Zollner para outro cargo (consultor da Diocese de Roma em temas relacionados à luta contra as agressões sexuais) foi aceita em 14 de março pelo papa "com seu profundo agradecimento por seus muitos anos de serviço", disse o cardeal O'Malley.
Zollner, jesuíta, assim como o papa Francisco, e um dos principais especialistas na luta contra o abuso contra menores dentro da Igreja Católica, atribuiu sua demissão a disfunções dentro da comissão.
"Durante meu trabalho na comissão, detectei problemas que precisam ser resolvidos com urgência e que me impossibilitaram de continuar minha missão", disse ele no Twitter.
"A proteção das crianças e das pessoas vulneráveis deve estar no centro da missão da Igreja Católica", mas "nos últimos anos aumentou a minha preocupação com a forma como a Comissão (...) atuou para cumprir esta missão", indicou.
- "Falta de clareza" -
Este reconhecido acadêmico e assessor próximo do papa critica, em especial, "a falta de clareza" no processo de seleção dos membros e funcionários da comissão, assim como a "responsabilidade financeira", que considera "inadequada, além da "informação insuficiente e a vaga comunicação" sobre o processo de tomada de decisões.
"Foram estes problemas estruturais e práticos que me levaram a me desligar da comissão", explicou.
Segundo o presidente da associação italiana de vítimas Rete l'abuso, Francesco Zanardi, o Vaticano está fazendo Zollner pagar o preço por "suas corajosas declarações (...) que contrariam as posições da Igreja".
"Sempre foi muito honesto", disse à AFP. "Gostaria de saber se ele renunciou por vontade própria ou se foi pressionado a renunciar", acrescentou, considerando que no momento a comissão pontifícia é "absolutamente inútil".
A instância, criada em 2014 e formada por especialistas religiosos e seculares e que em 2022 foi integrada à Cúria, a administração da Santa Sé, tem sido alvo de duras críticas.
Em 2016 e 2017, dois de seus membros, o britânico Peter Saunders e a irlandesa Marie Collins, também renunciaram, denunciando a falta de cooperação no Vaticano.
Apesar das medidas adotadas pelo papa desde a sua eleição, em 2013, como o levantamento do segredo papal sobre a violência sexual por parte do clero e a obrigação de denunciar os casos, as associações de vítimas consideram que ações concretas para combater os abusos ainda são insuficientes.
* AFP