O presidente russo Vladimir Putin anunciou na semana passada um cessar-fogo de 36 horas, que iniciaria na sexta-feira (6), para permitir que os cristãos ortodoxos do leste europeu pudessem comemorar o Natal, celebrado no sábado (7). No entanto, Volodimir Zelensky e representantes do governo ucraniano se manifestaram publicamente com críticas direcionadas à Rússia e alegando que não houve trégua no conflito armado.
— O mundo pôde ver novamente como as declarações do alto comando em Moscou são enganosas. A Rússia falou em um suposto cessar-fogo, mas na realidade bombardeou Bakhmut (leste da Ucrânia) e outras posições ucranianas — acusou o presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, em uma mensagem de vídeo publicada em suas redes sociais.
Na prática, o cessar-fogo terminou entre trocas de críticas dos ucranianos aos russos por não o terem respeitado e de Moscou a Kiev por não permitir a aplicação.
Desde o anúncio do cessar-fogo na quinta-feira (5), que seria o primeiro desde o início da ofensiva russa em fevereiro, as autoridades ucranianas já haviam questionado a veracidade da trégua e a consideraram uma tática para os inimigos ganharem tempo. Estados Unidos, França, Alemanha e Reino Unido também criticaram a iniciativa.
No sábado, o Ministro da Defesa russo disse que o governo estava respeitando a trégua e que continuaria cumprindo com sua palavra. "Apesar dos disparos de artilharia das forças armadas ucranianas em áreas povoadas e posições russas, as tropas russas continuarão a aplicar o regime de cessar-fogo anunciado até as 21h (18h em Brasília)", disse o Ministério da Defesa russo em nota.
Bombardeios
Em Bakhmut, o epicentro mais ao norte dos combates, jornalistas da AFP ouviram disparos em ambos os lados da frente na sexta-feira, horas após o estabelecimento do cessar-fogo unilateral decretado pela Rússia.
Segundo a promotoria ucraniana, duas pessoas morreram e 13 ficaram feridas na sexta-feira em Bakhmut, uma cidade amplamente devastada pelos combates e onde ambos os lados estão sofrendo perdas importantes.
As forças armadas russas também bombardearam a região de Kherson (sul da Ucrânia) na sexta-feira, matando um socorrista e ferindo sete pessoas. As informações são das autoridades ucranianas.
Os comunicadores presentes em Chasiv Yar, no leste da Ucrânia, também confirmaram bombardeios repetidos ao longo da manhã de sábado. No entanto, os ataques foram menos intensos em comparação com os dias anteriores.
Kirilo Timoshenko, denunciou neste domingo (8), em comunicado, outro ataque russo. "Como resultado da agressão armada russa, uma pessoa foi morta e outras oito ficaram feridas na região leste de Donetsk nas últimas 24 horas", diz mensagem.
Timoshenko ainda acrescentou que um cidadão foi morto na parte nordeste de Kharkiv e outro ficou ferido na região sul de Kherson durante o mesmo período.
Aliados da Ucrânia
Mesmo que tivesse sido respeitado o cessar-fogo decretado por Putin, isso teria oferecido apenas 36 horas de trégua em um conflito de alta intensidade, que dura quase 11 meses e sem previsão de uma resolução.
Os Estados Unidos, principal apoiador do governo ucraniano, prometeram na sexta-feira novos US$ 3 bilhões (cerca de R$ 15,7 bilhões) em ajuda militar à Ucrânia, que incluirá veículos de infantaria blindados Bradley e automóveis blindados de transporte de pessoal e obuses.
"Este ano vitorioso está apenas começando", disse a presidência ucraniana, acrescentando que o "pacote" americano também inclui mísseis de precisão Himars e antiaéreos Sea Sparrow.
A Alemanha também enviará 40 veículos blindados "Marder" no primeiro trimestre do ano, enquanto a França prometeu tanques leves de combate AMX-10 RC.
O governo britânico anunciou que organizará uma cúpula de ministros da Justiça em março para discutir possíveis medidas para apoiar o Tribunal Penal Internacional na investigação de crimes de guerra na Ucrânia.
O Natal Ortodoxo
Rússia e Ucrânia, em guerra desde fevereiro de 2022, celebraram no sábado o Natal ortodoxo, religião professada pela maioria dos cidadãos russos e ucranianos. Do lado russo, Vladimir Putin assistiu à missa sozinho à meia-noite de sexta-feira, na Catedral da Anunciação, abdicando, com isso, de seu costume de participar da liturgia em uma província ou nos arredores de Moscou.
Em mensagem divulgada neste sábado pelo Kremlin, o presidente russo felicitou os cristãos ortodoxos e indicou que este dia inspira "boas ações e aspirações".
"As organizações religiosas apoiam nossos soldados que estão participando de uma operação militar especial", declarou, em comunicado, o presidente russo, usando o termo oficial do Kremlin para a ofensiva na Ucrânia.
Do lado ucraniano, centenas de fiéis assistiram a uma missa histórica por ocasião do Natal ortodoxo no sábado no famoso mosteiro das Cavernas de Kiev, que antes respondia ao Patriarcado de Moscou, mas que agora passou para as mãos da Ucrânia, devido à guerra.
A homilia foi celebrada pela primeira vez por Epifânio, líder da Igreja Ortodoxa Ucraniana formada em 2018-2019 após um cisma com o Patriarcado de Moscou.
— Esperamos muito tempo para que este santuário fosse entregue a nós. É um acontecimento verdadeiramente histórico, pelo qual todos os ucranianos esperavam— disse à AFP Veronika Martiniuk, 19 anos, que lidera o coral.
— Cada país tem sua igreja. E temos a nossa própria igreja, ela está muito bem, uma igreja ucraniana, como deve ser — declarou Oksana Sobko, uma crente de 47 anos.