Por Paulo Roberto de Almeida
Diplomata de carreira, professor no Uniceub (Brasília)
A diplomacia bolsolavista, formulada em grande medida fora do Itamaraty e operada apenas formalmente por auxiliares da Casa, é feita de rupturas aos padrões históricos da política externa brasileira, tradicionalmente caracterizada pela busca de autonomia e comprometida, antes de tudo, com o interesse nacional.
Ela é tão bizarra no horizonte bissecular de nossa diplomacia que sequer pode ser assemelhada a um desvio padrão numa linha de tendência da política externa nacional, pois se situa completamente fora do quadro.
Observando-se seu desempenho em um ano e meio de esquisitices de inspiração bolsolavista, podem-se identificar os sete pecados capitais dessa diplomacia sui generis:
- Ignorância: não parece haver dúvida de que os que conduzem, de fato, as relações exteriores do Brasil são profundamente ignorantes sobre as relações internacionais e a própria política externa do Brasil. O filho 03 do presidente, que exerce esse papel, não tem a menor ideia de quem foi, nem nunca ouviu falar de Henry Kissinger.
- Irrealismo: esses “decisores” partem de uma fantasmagoria, o tal globalismo – que nunca demonstram existir empiricamente – e passam a atacar o método por excelência da diplomacia contemporânea: o multilateralismo.
- Arrogância: como a anterior tribo dos lulopetistas, eles acham que tudo o que existia antes foi errado; o chanceler acidental vive apontando distorções na política externa dos últimos 30 anos (falou até “depois de Rio Branco”), não mencionando que serviu de forma obediente todas essas distorções até com entusiasmo (há provas disso). Fez uma completa reforma do Itamaraty sem consultar seus colegas de carreira: por cima.
- Servilismo: a frase símbolo desse alinhamento é o famoso “I love you Trump” disparado por Bolsonaro em 2019 na ONU. Teve início no primeiro dia de governo, ao se oferecer uma base militar americana no Brasil, prontamente rejeitada por ministros militares, mas há muitos outros exemplos.
- Miopia: já manifestada numa alegada “ameaça globalista”, tem recusado a cooperação multilateral no combate a um desconhecido, até aqui, o comunavirus, e se manifestou em especial na animosidade com a China e na adesão unilateral ao governo de Israel, desconhecendo a complexidade dessas relações e ameaçando negócios e investimentos muito relevantes para o presente e o futuro do Brasil.
- Grosseria: manifestou-se sobretudo em direção de líderes estrangeiros que não pensam como o presidente, com ofensas a estadistas europeus comprometidos com a defesa do meio ambiente e também a dirigentes vizinhos de outras correntes políticas.
- Inconstitucionalidade: já está manifesta no servilismo, ou seja, na renúncia à independência nacional, para subordiná-la a um dirigente estrangeiro, mas também há intervenção nos assuntos internos de outros países, sendo a mais grave o desconhecimento do Direito Internacional, manifestado no apoio às sanções unilaterais do governo americano, o que pode concretizar-se inclusive contra o próprio Brasil, como no caso das salvaguardas abusivas (e ilegais) contra exportações brasileiras de aço e alumínio.
Esses pecados se revelaram na recusa do multilateralismo, na negligência de normas consagradas do Direito Internacional, no abandono da formulação autônoma da política externa, na relativização da noção de interesse nacional, na substituição da diplomacia profissional pelos preconceitos de amadores ignorantes e no desprezo aos princípios constitucionais das relações internacionais.
Dois exemplos, entre outros, da subordinação aos EUA: a aceitação do candidato americano à presidência do BID e a adesão ao veto de Trump à participação da empresa chinesa Huawei no leilão do 5G.