Supostas mensagens divulgadas nesta terça-feira (6) pelo jornal ABC Color revelam que o presidente do Paraguai, Mario Abdo Benítez, sabia dos termos do acordo energético de Itaipu assinado com o Brasil em 24 de maio. O trato, agora cancelado, elevaria os custos para a empresa estatal de eletricidade do Paraguai ANDE em mais de US$ 200 milhões, segundo legisladores e o ex-diretor da entidade.
O jornal divulgou conversas obtidas entre fevereiro e junho, mas quais Benítez teria pressionado o então diretor da ANDE, Pedro Ferreira, a assinar o acordo que, segundo o mandatário paraguaio, seria essencial para a economia do país.
"PEDRO, apresse [a] solução [entre] ANDE [e] Eletrobras. Está tudo parado. Temos que mover a economia. Itaipu é uma ferramenta. Não se pode ganhar totalmente em uma negociação", escreveu, em mensagens de 5 de março.
O diretor da ANDE disse inicialmente que "faria o possível", mas mais tarde alertou o presidente que o contrato traria prejuízo estimado em US$ 341 milhões ao Paraguai, além de fazer com que os preços da energia para os paraguaios subissem.
A ata com os termos negociados, assinada em Brasília, não foi divulgada publicamente. Nas mensagens publicadas pelo ABC Color, Ferreira mostra-se contrariado e dá a entender que foi pressionado a ficar em silêncio sobre a negociação:
"A prova de que é claramente inconveniente o acordo é que querem que o mantenhamos em segredo. Por que aqueles que assinaram e viram a ata não o defendem publicamente?", afirmou nas mensagens divulgadas.
"Quando isso estourar para você, eu e o chanceler teremos que tirar a cara. Nada mais vai explicar", teria escrito Ferreira.
O chanceler, Luis Castiglioni, e outros três altos funcionários do governo renunciaram no final de julho após o Executivo paraguaio pedir a anulação de ata. Antes, em 5 de julho, o presidente da ANDE colocou o cargo à disposição.
"Presidente, se serve de algo, negocie a minha cabeça, não a Ande. Eu não posso assinar algo contrário ao meu país, não conscientemente, e sobretudo algo que creio que vá lhe prejudicar muitíssimo", escreveu.
Ele renunciaria em 24 de julho, após discordar dos termos e se recusar a assinar o acordo, que finalmente veio a público.
As mensagens também mostram que o presidente estava ciente da negociação com a empresa brasileira Leros, tocada por José Rodríguez — advogado que afirma representar o vice-presidente Hugo Velázquez.
Após a renúncia de Ferreira, partidos de oposição anunciaram a intenção de pedir a abertura do processo de impeachment contra o presidente e o vice por "traição à pátria". Com o cancelamento do pacto assinado em 24 de maio, a formalização do pedido de afastamento arrefeceu, mas a intenção de julgar o presidente politicamente pode voltar a ganhar força.