A disputa em torno das tarifas e do consumo de energia gerada pela segunda maior hidrelétrica do mundo tem décadas. Com seus 14 mil megawatts de capacidade de produção, Itaipu só fica atrás da chinesa Três Gargantas, que tem 22,5 mil. No Brasil, é uma fonte de dor de cabeça: como é binacional, sua tarifa é cotada em dólares. Assim, toda a vez que o câmbio sobe, aumenta o custo da energia no Brasil, porque todas as distribuidoras foram obrigadas a comprar parte da oferta para tornar viável o megaempreendimento do regime militar.
No acordo para construção da usina, nos anos 1970, quase todo o investimento foi bancado pelo Brasil. Saíram daqui também cerca de 85% dos recursos para construção de uma linha de transmissão de US$ 500 milhões em território paraguaio. Nos últimos anos, enquanto o Brasil enfrentou recessão e estagnação, o Paraguai teve um crescimento econômico invejável. Nesse período, o consumo de energia lá aumentou 40%, enquanto a indicação de uso da energia gerada por Itaipu subiu apenas 8%, conforme dados da ONG Acende Brasil, espécie de observatório do setor elétrico no Brasil.
Ao informar que consumiria menos do que a quantidade efetiva, os paraguaios evitavam aumentar sua fatia no rateio dos custos do empréstimo que financiou a hidrelétrica. O que ocorria, na prática, era que o Brasil financiava a energia para empreendimentos no Paraguai, que por sua vez tentava atrair investimentos em seu território – inclusive convidando empresas brasileiras a se mudar para lá – usando como incentivo exatamente a energia barata. Em entrevista à coluna, no ano passado, o então ministro paraguaio de Indústria e Comércio, Gustavo Leite, afirmava que a eletricidade lá era a metade do custo brasileiro. Agora, o que está em questão é exatamente este ponto: o país precisa assumir os bônus e os ônus do acordo. Ou seja, declarar o que vai usar de fato e ampliar a fatia do que vai pagar do empréstimo, que tem vencimento final previsto para 2023.
O problema todo foi que, inspirado pelo espírito conspiratório que move parte do governo brasileiro, algum gênio imaginou que seria possível fazer um acordo secreto. E que os termos permaneceriam confidenciais indefinidamente. Foi uma movimentação tosca, uma trapalhada. Um chanceler renunciou, um pedido de impeachment contra o presidente paraguaio chegou a ser aberto, embora depois da anulação do acordo secreto tenha perdido força. Apesar da má fama do "Brasil imperialista", neste caso a causa era legítima.