Ao ser informado de que poderia ser isentado do Imposto de Renda por ser cardíaco e ter uma doença crônica no intestino, um militar da reserva que mora em Capão da Canoa, contratou o serviço do escritório CR Consultoria Tributária em setembro de 2022 para acelerar o processo. Três meses depois, começou receber da Receita Federal, de forma retroativa, os valores pagos.
— Em dezembro de 2022, já estava recebendo os valores de referência a 2018, em torno de R$ 16 mil, mais ou menos. No total, recebi R$ 79,5 e paguei R$ 19 mil pra eles — declarou.
Em junho do ano passado, recebeu notificação da Receita Federal contestando a documentação apresentada e pedindo ressarcimento do dinheiro. É que o órgão identificou nos papéis um laudo falso de doenças que o militar nunca teve: linfadenite crônica, que é uma infecção nos gânglios linfáticos, e câncer de mama, moléstia que raramente atinge os homens. O documento foi emitido por um laboratório privado de Porto Alegre.
— Eu não tenho dinheiro, a princípio vou ter que fazer empréstimo. O dinheiro que eu recebi eu apliquei numa reforma, fiz uma reforma na minha casa — conta o militar.
Um policial militar da reserva, de Passo Fundo, também contratou o escritório e recebeu de volta R$ 93 mil retroativos ao Imposto de Renda recolhido nos últimos cinco anos. O aposentado, que também pediu para não ser identificado, disse que pagou R$ 23 mil em honorários.
Depois de receber da Receita Federal R$ 70 mil em retroativos, foi notificado a devolver o dinheiro porque o laudo emitido pelo Subsistema Integrado de Atenção à Saúde do Servidor (SIASS), ligado à Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), era falso e mostrava-o como paciente de câncer. O militar já quitou parte dos valores, referentes a três anos de imposto devolvido. Ele disse que contou ao escritório que tinha diabetes e que nunca sofreu de câncer nem foi em qualquer órgão da UFRGS.
— Para "mim" pagar esses três anos, que deu R$ 69.037, eu tive de vender meu carro —afirma o militar, que ainda precisa recolher aos cofres da União cerca de R$ 33 mil.
Segundo a corregedoria da UFRGS, foram descobertas cerca de 180 falsificações.
— São falsificações, de certo modo, grosseiras. Alguns médicos que pretensamente assinaram esses laudos deram declarações pra nós dizendo que não foram os responsáveis — disse o corregedor Claudio Moacir Marques Corrêa.
Quando reclamavam, os clientes dizem que o responsável pelo escritório, o contador Carlos Rosa Júnior, respondia por meio de um vídeo, garantindo que era possível reverter a cobrança da receita.
— Nós temos vários recursos até que, de fato, haja alguma situação em que a gente tenha de se preocupar. Ou seja, até que tenha uma dívida tributária — disse Carlos, em uma gravação.
Além de contador, em pelo menos um dos contratos de prestação de serviço assinados com os clientes, ele também se apresentava como advogado.
Segundo a Receita Federal, são 16 as doenças que garantem isenção do Imposto de Renda a aposentados. Como as enfermidades que realmente possuem não fazem parte desse grupo, o escritório teria forjado laudos de doenças que dariam direito ao benefício. A dica para quem procura essa isenção é sempre conferir os documentos caso contrate um escritório ou consultoria. No entanto, não é preciso intermediário.
— O que se recomenda é de que primeiro ela procure o serviço médico oficial para obter o laudo e aí procure a sua fonte pagadora — explica o superintendente-adjunto da Receita Federal no Estado, Alexandre Rampelotto.
A Polícia Civil diz que quatro ocorrências sobre o golpe foram registradas, todas encaminhadas à Polícia Federal.
O que diz em nota o Conselho Regional de Contabilidade
"Com relação a solicitação de informações sobre possíveis crimes contra a ordem econômica e tributária, cometidas pelo técnico em contabilidade Carlos Roberto da Rosa Júnior, CRCRS nº 91.659, esclarecemos que, até o presente momento, não recebemos qualquer informação, bem como nenhuma denúncia em desfavor do mesmo.
Outrossim, já estamos abrindo expediente para acompanhamento da situação.
Tão logo consigamos mais informações a respeito, tomaremos as medidas cabíveis, lembrando que a infração mencionada (crimes contra a ordem econômica e tributária) tem prevista como pena a cassação do exercício profissional e censura pública."
O que diz a defesa de Carlos Roberto da Rosa Júnior
"A defesa técnica constituída pelo Sr. Carlos Roberto da Rosa Júnior informa que se manifestará somente depois que tiver acesso integral aos autos da investigação, uma vez que não teve qualquer tipo de acesso ao inquérito policial até então e desconhece qualquer acusação em relação ao seu constituinte. Ainda, informa que o Sr. Carlos Roberto da Rosa Júnior está à disposição das autoridades para prestar esclarecimentos e contribuir com a investigação realizada."
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