Dos quatro servidores públicos investigados pela Polícia Civil na Operação Verba Extra, dois responderam a sindicância depois da revelação, em 2021, de suspeitas de mau uso de recursos para consertos em escolas municipais de Porto Alegre. Um dos procedimento foi concluído e resultou em aplicação de advertência ao servidor. A outra sindicância ainda está sem conclusão, um ano e oito meses depois da determinação de abertura da apuração interna.
Na segunda-feira (9), a 2ª Delegacia de Combate à Corrupção (2ª Decor) do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) fez buscas em duas sedes da Secretaria Municipal de Educação (Smed) e em mais 24 locais. A apuração, aberta a partir de reportagens do Grupo de Investigação da RBS (GDI), verifica crimes licitatórios, direcionamento de contratações e superfaturamento nos valores de serviços.
A polícia não deu detalhes sobre os suspeitos, mas o GDI apurou que os quatro servidores investigados são o engenheiro eletricista Esmael de Oliveira Flores, o economista Ramiro Porto da Silva Tarragô, o administrador Júlio César dos Passos e o engenheiro civil Guilherme Flores da Cunha Filho.
A auditoria feita pela prefeitura, cujo relatório final foi concluído em fevereiro de 2022, entendeu não haver elementos para que Flores e Tarragô fossem alvo de sindicância, e o caso foi arquivado em relação a eles. Quanto a Passos e Cunha Filho, foi indicada a abertura de sindicância para apurar o cometimento de falta disciplinar. Na terça-feira (10), sem detalhar nomes, a Smed informou que uma sindicância foi concluída e resultou em advertência. Já outra segue aberta, um ano e oito meses depois dos apontamentos da auditoria.
Em 2021, foi constatado que assinaturas de Passos e Tarragô constaram em solicitações de liberação de valores de verbas extras sob suspeita. Passos, que era coordenador-geral de Administração e Serviços da Smed, foi colocado em férias e, depois, afastado da secretaria. Tarragô, que atuava há 16 anos na Smed e era secretário-adjunto, foi afastado. Como ocupava Cargo em Comissão (CC), acabou exonerado.
Depois de fazer concurso, ele voltou para a prefeitura. Atualmente, está lotado no Departamento Municipal de Habitação. Passos atua na Secretaria Municipal de Saúde. Já Flores e Cunha Filho estão na Secretaria Municipal de Obras.
Os servidores tiveram os telefones celulares apreendidos na operação, conduzida pelo delegado Augusto Zenon, assim como os demais investigados. Depois de os materiais serem analisados, os investigados serão chamados a prestar depoimento.
Em 2021, quando o GDI revelou as suspeitas, a prefeitura apresentou levantamento dos gastos de verba extra no período entra 2017 e 2021. Foram R$ 8 milhões na rubrica, sendo que haveria R$ 1,4 de superfaturamento. Mas o uso dessa rubrica é mais antigo. Como não havia norma regulando a aplicação, a prefeitura e a Procuradoria-Geral do Município não sabiam informar a origem.
Contrapontos
O que disse Ramiro Tarragô:
A auditoria não só arquivou o caso como mostrou que não havia materialidade com relação a mim sobre os fatos. É o que espero da polícia. Eu sou a favor da investigação, vou conversar com a delegacia e me colocar à disposição. Eu sei as coisas que fiz enquanto estive na secretaria e nenhuma delas envolveu o que está posto ali (na investigação). Pelo meu cargo, fui coordenador financeiro, acho natural ser investigado. Espero que seja uma última etapa dessa fase. A polícia pode ter acesso a todos meus dados. Quero que esclareçam isso tudo.
O que disse Daiane Fagundes, advogada de Esmael de Oliveira Flores:
Como ainda não tivemos acesso à investigação, não vamos nos manifestar no momento.
O que disse Fábio Fischer, advogado de Júlio César dos Passos:
A defesa informa que está analisando os elementos que levaram a autoridade policial a postular a expedição de mandado de busca e apreensão contra seu cliente. A defesa salienta que o investigado se coloca à disposição do Poder Judiciário a fim de colaborar para com todos os passos do processo e que eventuais manifestações acerca do mérito da questão serão objeto de nova manifestação nos próximos dias, reiterando a afirmação de inocência do investigado, o que será comprovado nos autos.
O que disse a Smed:
A prefeitura não possui os instrumentos para apuração mais profunda acerca dos servidores. Por isso, encaminhou aos órgãos competentes a auditoria especial, que contribuiu para a investigação da Polícia Civil. Todos os servidores que apresentaram indícios de envolvimento foram afastados das atividades da Smed ainda em setembro de 2021. Três servidores tiveram os processos de investigação arquivados por ausência de materialidades. Dois servidores foram submetidos a sindicâncias: uma segue em curso e a outra resultou na aplicação de advertência.
O que diz o ex-prefeito Nelson Marchezan:
Não tenho informações atuais sobre a investigação. No entanto, sempre que há desvio ou mau uso de recursos públicos, entendemos que deve haver a devida responsabilização. Essa é a minha marca pessoal e assim foi no nosso governo.
Em relação ao programa de verba extra para as escolas, esse visa dar aos diretores agilidade em pequenos reparos que poderiam causar grandes prejuízos ou acidentes graves.
São recursos para reparos de urgência, mas fundamentais para as escolas, como desentupimento de canos, troca de vidros, maçanetas, reparos elétricos e coisas do gênero.
O programa já existia, mas foi ampliado durante a gestão 2017-2020, pelos resultados que podia proporcionar às escolas e que, de fato, proporcionou. Mesmo assim, são recursos modestos, abaixo dos limites para licitação. Considerando os valores divulgados, estamos falando, para cada escola, de recursos em média menores que R$ 20 mil por ano. Pouco mais de R$ 1 mil por mês.
Importante registar que as despesas são decididas e os fornecedores escolhidos e pagos pelos diretores e conselhos escolares de cada uma das 99 escolas municipais.
GZH ainda tenta contato com Guilherme Flores da Cunha Filho. O espaço está aberto para a manifestação.