O advogado Alessandro Batista Rau, investigado por lesar clientes em centenas de processos trabalhistas, foi indiciado pela Polícia Civil. O titular da 2ª Delegacia de Porto Alegre, delegado Vinícus Nahan, diz que foram concluídos esta semana seis inquéritos envolvendo seis vítimas que tiveram prejuízo aproximado de R$ 2 milhões.
O suspeito e mais três pessoas ligadas a ele foram indiciados pelos crimes de patrocínio infiel (que é trair, na qualidade de advogado ou procurador, o dever profissional, prejudicando seus clientes), além de estelionato, apropriação indébita e associação criminosa. Os demais responsabilizados são o pai do advogado, que é dono de uma empresa de perícia contábil apontada por ter comprado os processos trabalhistas, além de duas mulheres: outra advogada e a coordenadora do setor administrativo, ambas do escritório de Rau. Os nomes deles não foram divulgados. GZH apurou que o pai de Rau é Carlos Roberto Rau, dono da Pertto Perícias Contábeis Ltda .
O delegado Nahan diz ainda que, como o caso envolve a Justiça do Trabalho, foi definido que a competência é federal, por isso está sendo encaminhado para a Polícia Federal (PF), assim como todas as outras denúncias que chegam na 2ª Delegacia sobre o advogado. Rau é suspeito de ter provocado um prejuízo de até R$ 38 milhões. A estimativa é da própria PF, que já tem outro inquérito instaurado após cumprir mandados de busca e apreensão no dia 14 de julho deste ano em endereços do suspeito e demais pessoas envolvidas no esquema investigado.
Além disso, a Justiça Federal já havia determinado, na época, a instalação de uma tornozeleira eletrônica para monitorar Rau. De acordo com a apuração federal, são cerca de mil processos em que o escritório dele atua na Justiça do Trabalho do RS. Desses, mais de 50 foram analisados e, a partir dos dados coletados, foi calculada uma média de valores de cada um. Além da análise dos documentos e materiais apreendidos no mês passado, que devem auxiliar na sequência da investigação, a PF pediu o bloqueio de bens que ainda estão sendo levantados. A intenção é garantir, ao final do processo criminal, uma restituição às vítimas.
O caso envolvendo o advogado e um escritório de contabilidade que comprava créditos trabalhistas foi revelado em 14 de julho pelo Grupo de Investigação da RBS (GDI), mesmo dia em que houve a ação da PF. Foram analisados por dois meses processos e documentos, a partir de uma suspeita que surgiu no Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, que notificou as autoridades para investigar uma suspeita de fraude.
Conforme a apuração do GDI, o advogado atuava de duas formas. Uma delas era a compra de créditos trabalhistas dos próprios clientes, por meio de uma empresa registrada no nome do pai dele, com valores muito inferiores ao definido pela Justiça. Em apenas um dos casos, um processo de R$ 1,8 milhão foi cedido pelo trabalhador por apenas R$ 75 mil. A outra forma seria embolsando valores sem justificativa ou até com cobrança de honorários acima do permitido.
Um dos casos, que deu origem à investigação, envolve o crédito de R$ 400 mil. O valor total da indenização do autor contra sua antiga empregadora reivindicava R$ 1,8 milhão, mas os R$ 400 mil já haviam liberados pela Justiça em relação a fatos que o juiz entendeu estarem comprovados. O dinheiro foi depositado pela empresa em juízo, mas o advogado do autor da ação não o avisou sobre o crédito disponível para saque.
Em um passo seguinte, uma empresa chamada Pertto Perícias Contábeis Ltda, que, segundo as investigações, pertenceria ao pai do advogado, teria oferecido R$ 75 mil para comprar esses créditos e mais o restante que poderia ser definido pela Justiça como direito do autor da ação. O valor é bem inferior ao que já estava à disposição. Ainda são analisadas condutas em casos de honorários acima do permitido e apropriação indébita de valores.
OAB
O advogado Rau está suspenso preventivamente pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A decisão ocorreu em sessão da 4ª Turma Julgadora do Tribunal de Ética e Disciplina, no início do mês. Como os processos éticos tramitam em sigilo, não há informações sobre os termos da suspensão e o que foi analisado pelos julgadores.
Na prática, a decisão impede o advogado de exercer a profissão, algo que já estava determinado cautelarmente pela Justiça Federal, a pedido da Polícia Federal. Ainda cabe recurso administrativo da decisão, mas a medida é válida até segunda ordem.
Contraponto
O advogado Gustavo Nagelstein, que defende Alessandro Rau, já havia dito que ficou surpreso com a medida da PF porque afirmou ter explicado toda situação para a Polícia Civil. No entanto, sobre o indiciamento feito pelo delegado Nahan, ele ainda não se pronunciou. Sobre o procedimento federal, o advogado ressaltou anteriormente que seu cliente está contribuindo com a investigação e que não se configura ilicitude porque todos os valores em questão foram combinados e documentados anteriormente com todas as pessoas.
Em relação à OAB, o advogado Ferdinand Georges de Borba D'Alençon, que representa Alessandro Rau no processo ético, informou que "nos termos do artigo 72, § 2º, da Lei Federal 8.906/94, o processo administrativo disciplinar perante a OAB, tramita em sigilo, até o seu término, o que impede eventuais comentários em relação à notícia que foi divulgada".