• A Báril, empresa que fez fortuna e crédito no mercado imobiliário gaúcho com mais de 2 mil empreendimentos erguidos nos últimos 18 meses, sobretudo no Litoral Norte, agora é responsável por mais 500 imóveis fantasmas;
• Até 2013, a empresa entregava a cada verão 200 unidades de "segundas moradias", os chamados imóveis de lazer, usualmente nas praias;
• Problemas com a Justiça, decorrentes de danos ambientais, e a crise no mercado de imóveis em 2014 fizeram com que, desde 2015, a Báril deixasse de entregar 585 empreendimentos prometidos em cidades como Tramandaí, Xangri-lá e Imbé;
• Um dos sócios da empresa, Renato Báril, chegou a "declarar pobreza", ao solicitar em janeiro de 2018 o não pagamento das custas judiciais, alegando não ter condições de arcar com a defesa;
• A Báril diz que não tem prazo para concluir as obras inacabadas.
Até meados da década e durante 30 anos, o sobrenome Báril foi sinônimo de boas notícias, nas páginas de Economia e nas colunas sociais. Empreendimentos lançados pelo patriarca, Fishel, eram abrilhantados pelo senso estético da mulher, a arquiteta Anne, até hoje símbolo de bom gosto e requinte. Os filhos do casal, Jaime e Renato, tocavam as obras e as vendas.
As dificuldades, segundo relataram membros da família Báril em audiência no Ministério Público, começaram com duas investigações sobre obras da empreiteira – uma cível e uma criminal – que apontam danos ambientais supostamente cometidos pela empresa ao erguer condomínios no Litoral Norte.
Os Báril sustentam que nada ficou comprovado, mas os prejuízos em credibilidade foram enormes. A inadimplência da construtora se acentuou, também, pela crise econômica que o Brasil atravessa desde 2016.
Mesmo assim, a Báril continuou lançando projetos. GaúchaZH localizou anúncios imobiliários de maio de 2018 nos quais o Lagune aparecia à venda, mesmo que nenhum dos apartamentos previstos para 2017 tivesse sido entregue – acabaram não saindo do papel.
A Báril fez dois movimentos dentre as tentativas de sair da crise. Um deles foi se associar a empresas de outros Estados, dispostas a concluir alguns dos condomínios inacabados. Em outro, entregou a bancos credores os imóveis incompletos – com isso, honrou parte dos débitos. Nada disso impediu que centenas de famílias ficassem sem sua residência de praia, não concluída pela construtora.
Ao Ministério Público foram apresentados valores que a Báril ainda tem a receber das vendas, para mostrar a viabilidade de outra empresa assumir as obras. Clientes que adiantaram dinheiro para construir imóveis com a construtora têm tentado reaver os valores. Em um primeiro momento, os donos negociaram trocas e prazos, mas, com o passar do tempo, os acordos ficaram escassos.
O enxugamento de gastos da Báril resultou no fechamento das sedes em Porto Alegre. A maioria dos telefones da empresa não funciona mais e o site saiu do ar. Um escritório na Rua Hilário Ribeiro, coração do bairro Moinhos de Vento, na Capital, abrigava seis empresas do grupo. Também não existe mais.
A Báril inclusive alegou, na Justiça, que essas empresas não tinham relação entre si. Com isso, pretendia evitar a penhora de bens de uma firma por dívidas contraídas pelas outras. Mas os juízes têm interpretado que, por funcionarem no mesmo endereço, fazem parte do mesmo grupo econômico, o Báril.
Isso foi um duro golpe para a construtora, que foi condenada em diversas ações de indenização. Conforme levantamento feito por GaúchaZH, o único veículo em nome da empresa é um Fiat Uno Mille Way, ano 2012, que está penhorado em 10 ações judiciais diferentes. Um dos sócios da empresa, Renato Báril, solicitou em janeiro de 2018 o não pagamento das custas judiciais, alegando não ter condições de arcar com a defesa dos processos. Advogados costumam chamar isso de "declaração de pobreza".
Questionada pelo promotor Gustavo Munhoz, do setor de Defesa do Consumidor do Ministério Público, a Báril afirma não ter como estabelecer um prazo de conclusão das obras ou ressarcimento dos clientes. A empresa assegura que a venda de imóveis nos locais sem construção está parada. Só são vendidas unidades construídas. As únicas obras existentes agora são no Páteo Marbella, em parceria com a Tecverde.
O Procon de Porto Alegre também abriu investigação a respeito da Báril, por publicidade enganosa e suposto descumprimento contratual. Uma terceira investigação, criminal, foi aberta pela Polícia Civil para verificar possível ocorrência de estelionato por parte da construtora.
Os clientes têm formado grupos para acionar a Báril na Justiça. A empresa informa que não pretende pedir recuperação judicial ou falência. Disse que a continuidade das obras se dará por parcerias, mas não deu prazo para isso.
Empresa busca "melhor solução", diz advogada
Em busca de esclarecimentos sobre a crise que atinge a incorporadora Báril, a reportagem enviou 13 perguntas à empresa. Elas foram respondidas pela chefe do Departamento Jurídico, advogada Raíssa Oliveira Scherer. Algumas questões ficaram de ser detalhadas posteriormente, porque a empresa não dispunha dos dados no momento. A seguir, as principais respostas:
Sobre 585 imóveis não entregues
A Báril esta respondendo a um inquérito perante o Ministério Público – Defesa do Consumidor, onde já prestou todas as informações e dados solicitados pelo órgão ministral. Cabe, todavia, esclarecimentos. A Báril construiu 2.285 unidades em 18 anos. A crise que assolou o mercado imobiliário em 2014 afetou consideravelmente a empresa, principalmente pelo fato de a mesma atuar no mercado de segunda moradia, o que gerou atraso na entrega de alguns imóveis. Entre os imóveis ainda não entregues, há diversas situações: imóveis com prazo de entrega não expirado, imóveis não quitados – grande parte de imóveis com pagamentos de parcelas suspensos, sendo estes a maioria –, imóveis rescindidos, imóveis permutados por casas prontas... Cabe referir que clientes dos residenciais Lagune e Costero, utilizando os recursos investidos, migraram seus investimentos e adquiriram imóveis em outros empreendimentos.
Sobre a parceria com outras empresas para conclusão das obras
A Báril fez em 2016 uma parceria com a Tecverde, na qual 90 imóveis foram construídos com recursos da própria Tecverde. A Báril realizou ainda parceria com uma construtora para realização das obras no condomínio Las Olas, onde os clientes pagaram com os saldos devedores de seus contratos de compra e venda a construção de suas unidades. A parceria com a Tecverde continua ativa somente pelo fato de que nem todas as 90 casas foram entregues.
Sobre o único veículo em nome da empresa, penhorado em 10 ações judiciais
Em razão das atividades, a Báril tinha apenas um veículo que circulava abastecendo com material miúdo as obras entre os municípios em que construía no Litoral. Os demais veículos utilizados eram dos funcionários, sobre os quais remunerava por quilômetro rodado.
Sobre a "declaração de pobreza" de um dos sócios
Cabe aqui esclarecer que a empresa, bem como os sócios, postulam Assistência Judiciária Gratuita (AJG), benefício em que a parte afirma que não está em condições de pagar custas e honorários, sem prejuízo do sustento próprio e de sua família. A legislação estabelece que todos os demandantes e demandados que estejam em situação econômica que não lhes permita pagar custas de um processo podem vir a ser contemplados com tal benefício. Salienta-se que as custas processuais são calculadas de acordo com o valor da causa, o que, dependendo do montante que alcançar, pode tornar inviável o pagamento.
Sobre a ação judicial que manda demolir parte de um condomínio em Imbé
Em relação ao processo movido pelo Ministério Público Federal quanto ao Condomínio Las Olas (Imbé), a empresa acredita que a decisão proferida em primeiro grau será reformada, uma vez que se trata de um empreendimento total e regularmente aprovado pelos órgãos competentes, bem como cumpriu todas as normas de direito ambiental.
Sobre o lançamento de novos condomínios, mesmo em dificuldades financeiras
Importante mencionar que a empresa, assim que percebeu a crise financeira que estava adentrando, deixou de comercializar as unidades dos empreendimentos Lagune e Costero (ambos lançados em 2013) e passou a priorizar a entrega dos imóveis vendidos. Após entrar em dificuldades financeiras, a Báril não lançou nenhum empreendimento.
Sobre o fechamento de escritórios da Báril e dificuldade dos clientes em obter respostas
As dificuldades financeiras da empresa a obrigaram há mais de um ano a fechar sua sede em Porto Alegre e, desde então, tem seu escritório apenas no Litoral, na Av. José Bruno Klein, 467, município de Xangri-lá. As dificuldades enfrentadas acarretaram a diminuição significativa na estrutura de atendimento, inclusive o site, mas o escritório funciona em horário comercial, de segunda a sexta-feira.
Sobre o futuro da empresa e os planos
Há diversas especulações e falácias veiculadas nas redes sociais, que não condizem com a realidade da situação. A empresa não decretou falência, não está em recuperação judicial, bem como continua atendendo a todos os clientes que a procuram. A empresa está sempre na busca da melhor solução para que nenhum cliente venha a ser prejudicado, sendo que em nenhum momento se exime de prestar qualquer esclarecimento, seja sobre a situação de qualquer empreendimento por ela realizado ou qualquer outro assunto do interesse do cliente.
GaúchaZH também solicitou informações detalhadas sobre quantos imóveis deixaram de ser construídos em cada condomínio e quanto a Báril deve aos credores que firmaram contratos de aquisição desses imóveis. A advogada da empresa informou que encaminharia os dados em alguns dias.