Visto de cima, o entorno do posto Sim, na freeway, parece o pátio de uma grande transportadora. Desde o início da enchente, quando estradas e municípios da Região Metropolitana entraram em colapso, dezenas de caminhões estão no paradouro, aguardando a água baixar.
Na manhã desta quarta-feira (8), havia 101 veículos de carga estacionados no local — a maior ocupação desde a inauguração, em 2020.
Enfileirados ao lado das bombas de combustível e nas duas laterais do posto, eles formam um mosaico das dificuldades logísticas do Rio Grande do Sul. Vindos dos mais diversos pontos do país, seus motoristas guardam toneladas de diferentes mercadorias, desde máquinas agrícolas a um consultório inteiro de dentista — mas o principal é uma dose extra de paciência de quem não sabe quando vai voltar a rodar.
Maurício Pereira, 35 anos, saiu de casa em Guaratinguetá, em São Paulo, na segunda-feira da semana passada (29). Carregou 27 toneladas de material de limpeza e higiene em Pouso Alegre, em Minas Gerais, e desceu para o Rio Grande do Sul.
Quando soube que as enxurradas impediam o acesso a Esteio, ainda ficou um dia aguardando em Laguna, em Santa Catarina, mas desde quinta-feira (2) caminha sem parar pelo posto Sim da freeway procurando notícias da enchente no celular.
— O brabo é a desinformação. Na segunda (dia 6) me disseram que eu podia ir a Esteio descarregar, mas cheguei lá e o galpão estava embaixo d'água. Levei seis horas para retornar por causa do congestionamento na (RS) 118 — lamenta Pereira.
Mais impaciente ainda está a esposa do caminhoneiro. Aos 32 anos, Tamires Gomes sonhava em conhecer o sul do país. Na primeira vez que compartilha a boleia com o marido e a filha Heloísa, seis anos, está há seis dias parada em um posto de combustível e dependendo da ajuda da mãe para cuidar dos outros dois rebentos que ficaram em Guaratinguetá.
— Queria tanto viajar para cá e agora é só preocupação. A Heloísa não tem com o que brincar e a gente gastando demais sem sair do lugar — desbafa Tamires.
Imprevistos são rotineiros na vida dos caminhoneiros. No pátio do Sim, eles formam rodas de conversas, preparam almoço em grupo, tudo para fazer as horas passarem mais rápido. Porém, há quem não se acostume com os infortúnios da estrada. Há cinco anos viajando com o marido, o caminhoneiro Gelson Toretti, a dona de casa Silvana Teixeira enche os olhos d'água ao comentar a situação.
— Tudo isso é muito triste. Eu sou mãe e fico vendo essas crianças que perderam tudo, pedindo doação e a gente aqui sem poder fazer nada — desabafa Silvana, ao lado do caminhão carregado com 32 toneladas de açúcar com destino ao Uruguai.
Bem mais tranquilo está Alexandre Vieira, 44 anos. O paulistano saiu sexta-feira (3) de São Paulo trazendo 22 toneladas de ração canina para Santa Cruz do Sul. Desde domingo (5), está parado no Sim ao lado da mulher, Roseli Martins. Eles matam a saudade dos filhos pelo telefone, dormem e se alimentam no caminhão.
— A gente vai levando do jeito que pode. Infelizmente, esse tipo de coisa é comum na vida do caminhoneiro — resigna-se Vieira.