Desde que a investigação foi revelada pela Polícia Civil, o número de supostas vítimas do cirurgião de Novo Hamburgo João Couto Neto, 46 anos, tem aumentado. Na última semana, ele vinha sendo investigado pela morte de 18 pessoas em procedimentos que estão sob suspeita. Com mais duas mortes registradas na noite de terça-feira (27), há conhecimento de 20 óbitos que teriam acontecido após intervenções feitas pelo médico.
A informação é do delegado Tarcísio Kaltbach, da 1ª Delegacia de Polícia de Novo Hamburgo, cidade do Vale do Sinos onde o profissional atua. Segundo o policial, há 73 boletins de ocorrência registrados por pessoas que tiveram lesões ou mutilações após cirurgias feitas por Couto Neto.
— Tem cirurgias simples, em que a pessoa deveria ter alta no mesmo dia, mas ficava uma, até duas semanas internada. Não tem lógica, por exemplo, a pessoa fazer cirurgia de hérnia e ter o intestino perfurado — afirmou o delegado, ao programa Timeline, da Rádio Gaúcha.
O indiciamento do médico, segundo o delegado, deve seguir a linha de homicídio com dolo eventual — quando a pessoa assume o risco. Tarcísio pondera que, pelas impressões colhidas até agora, não há como concluir que o investigado causaria os danos de forma intencional.
— O dolo é aquela vontade consciente, deliberada, de causar o dano. Ele assumia o risco, por isso trabalhamos com homicídio de dolo eventual. Seja de que forma causou isso, intencional ou não, na verdade ele causou o resultado danoso na vítima — explica.
O delegado citou o caso de uma pessoa que teve de fazer 13 cirurgias de correção após um procedimento com o médico. Em outro caso, conforme a polícia, um paciente ficou em estado vegetativo após ser atendido pelo investigado.
Segundo a polícia, análise dos relatórios apontam que Couto Neto, que é especialista em sistema digestivo, fazia dezenas de cirurgias em um turno. A suspeita da Polícia Civil é de que ele agiria dessa forma para ganhar mais dinheiro.
Desde 12 de dezembro, o médico está afastado de cirurgias e intervenções invasivas, o que se estenderá por 180 dias. O consultório está fechado e ele responde ao processo sem poder se ausentar da Comarca.
No início do mês, o Hospital Regina, uma das instituições onde o médico atuava, informou à imprensa que foi formada comissão para apurar internamente os fatos. A medida ocorreu no mesmo dia em que houve um protesto na instituição. Nesta quarta-feira (28), o hospital mandou nota na qual afirma que está "colaborando com as autoridades na investigação" (leia a íntegra abaixo).
O Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers) informou que uma sindicância foi aberta para investigar o caso, e que ela corre em sigilo.
Contraponto
O advogado de João Couto Neto, Diego Mariante, afirmou que a defesa, por enquanto, continua optando por não se manifestar.
Nota de esclarecimento
O Hospital Regina enviou a seguinte nota:
Promover saúde com a melhor experiência no cuidado é a missão do Hospital Regina nestes quase 93 anos de atuação em Novo Hamburgo. Assim, em respeito à comunidade, colaboradores, corpo clínico e pacientes, vimos a público esclarecer que, desde o último dia 12, estamos colaborando com as autoridades na investigação das acusações envolvendo o médico João Batista do Couto Neto.
A Instituição já finalizou a entrega da documentação médica solicitada pela justiça, mas desconhece o inquérito policial, uma vez que o processo corre em segredo de justiça e tem como foco da investigação o médico, não o Hospital.
No mandado de busca e apreensão apresentado pela Polícia Civil são citados 14 nomes de pacientes deste médico. No entanto, deste total três pacientes realizaram somente exames no Hospital Regina e das 11 pessoas que realizaram cirurgia, quatro formalizaram relato na Ouvidoria referente ao atendimento prestado pelo referido médico. As reclamações foram prontamente acolhidas e uma delas, inclusive, foi encaminhada à Comissão de Ética do corpo clínico.
Esclarecemos, ainda, que o Dr. João Couto faz parte do Corpo Clínico aberto do Hospital e não possui vínculo de trabalho via CLT ou contrato de prestação de serviço com a Instituição. Neste caso, o médico cirurgião utiliza a estrutura do hospital para exercício da sua profissão. O Hospital não indicou nem elegeu o médico João Batista do Couto Neto. Todos os procedimentos que constam no mandado policial e que estão sob investigação foram realizados pelo referido profissional, o qual foi escolhido pelos pacientes para realizar os procedimentos através dos convênios e meios particulares.
Reiteramos que o atendimento médico hospitalar, sendo ele clínico ou cirúrgico, realizado dentro da Instituição obedece a protocolos bem definidos de qualidade e segurança do paciente e são acompanhados por uma equipe multiprofissional especializada. Preocupados em sempre oferecermos o melhor cuidado e uma assistência focada em excelência, estamos em processo de acreditação hospitalar, para certificação na metodologia canadense QMentum International™.
A Instituição, ao longo de quase um século de vida, reafirma o seu compromisso no cuidado e na excelência dos serviços prestados por seus mais de 1.400 colaboradores e 700 médicos do corpo clínico, tendo o paciente no centro do nosso cuidado. Com toda sua expertise, o Hospital realiza, em média, 1.750 cirurgias por mês nas mais diversas especialidades. Além disso, são cerca de 10 mil exames médicos realizados por mês.
O Hospital Regina lamenta, profundamente, os fatos relatados e informa que prontamente criou uma Comissão de Comunicação Interna para acolhida e escuta dos representantes dos pacientes e familiares.
Direção do Hospital Regina