Onira e Odilon Machado Ramos têm mais em comum do que a primeira letra de seus nomes, já que os 13 irmãos foram batizados com a inicial “O”. A família, de Santo Antônio da Patrulha, no Litoral Norte, reúne uma série de cantores especializados no terno de reis, serenata portuguesa presente no Rio Grande do Sul desde o século 17 - segundo os escritos bíblicos, os três reis magos visitaram o recém-nascido Jesus Cristo em 6 de janeiro, data marcada como Dia de Reis, a última noite da celebração natalina.
— Visitar as casas, com a cantoria, semelhante a uma serenata, é levar a boa nova do nascimento de Jesus. E aqui temos muita fé — explica o músico, poeta e radialista de 69 anos.
Há mais de um século, os Machado Ramos se apresentam nas residências do interior, litoral ou outras regiões, em praças públicas ou nos seus próprios lares, no período próximo do Natal até o Dia de Reis. Formam “Os Cantores Açorianos”, hoje na quarta geração, dos 30 aos 80 anos de idade.
— É amor, não tem outro nome. Começou como nosso avô, que passou para o pai. Imagina, ele (o pai, Demétrio) nasceu em 1904, e cantava desde jovem. E hoje temos nossos sobrinhos-netos — comemora Onira, 67.
Demétrio Machado Ramos era uma pessoa com deficiência e seguiu se apresentando e compondo poemas com temática açoriana, reiteram os seus filhos com nostalgia. Odilon carrega, também com orgulho, publicações acerca da tradição, como o DVD “Cantadores Açorianos”, os livros “50 anos de Poesia” e “Antes Que Me Esqueça”, o último escrito durante uma internação de Odilon no Hospital Dom Vicente Scherer, na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, para tratar uma isquemia transitória, com perda temporária da memória. Pelo perfil do Instagram @odilon.ramospoeta, parte dos trabalhos podem ser conferidos.
Outro “mestre” - como são chamados os declamadores dessas cantigas - memorável foi o irmão mais velho, Orêncio Machado Ramos. Ele morreu na década passada, vítima de um câncer, “cantando o terno até os seus últimos dias”, reforça Odilon. E complementa ter sido “eleito” pelo mano para a sequência nos vocais.
— Não existia, lá com os portugueses, e com meu avô, gravador ou outro equipamento. Então a história se mantêm viva assim, sendo cantada, por isso nosso esforço de não deixá-la acabar — garante.
A partir das 20h desta quinta-feira (6), o conjunto apresentará o terno de reis na Praça da Boa Viagem, em Santo Antônio da Patrulha. O show é gratuito e contará também com o grupo Estrelas Divinas.
Horas antes da apresentação, a dupla falou ao vivo na Rádio Gaúcha. Emocionados com o espaço devidamente cedido, levaram a reportagem a um passeio pela cidade. Na Fonte Imperial, segundo a lenda, os solteiros bebem da água e garantem um casamento com cônjuge do município. E é nos casarões centenários do centro histórico que os irmãos encontram comparação com o seu trabalho.
— Manter viva a história para que nunca se esqueça — finaliza Onira.